AO ACASO…
DIA INTERNACIONAL DO TRABALHADOR EM TEMPOS DE ESTADO(S) DE CRISE
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Assistimos, invariavelmente, neste dia, todos os anos, e neste não foi exceção – apesar das fortes limitações a que estamos sujeitos pela pandemia por que passamos e por via do estado de emergência – a fortes manifestações dos trabalhadores, que denunciam a postergação e a precaridade dos seus direitos, constitucionalmente consignados, nomeadamente, quer no que se refere às suas condições de trabalho, quer à forma como são remunerados numa sociedade neoliberal, como aquela em que vivemos. Em que a política dos governos, territorialmente confinados ou adstritos, são ineficazes ou inoperantes, face ao poder da «mão invisível» do Mercado Global.
O estado westfaliano, que herdámos do século XIX, deixou, nos tempos de hoje, de ter qualquer sentido e/ou eficácia: existe um poder, circunscrito territorialmente. Mas as escolhas políticas estão fortemente condicionados, porquanto, as mesmas, já não estão nesse poder eleito pela cidadania. Manifestamente, estamos perante uma evidente e decisiva separação entre poder e política, ou seja, entre a real capacidade de levar coisas a cabo (poder) e a habilidade em decidir que coisas são necessárias e devem ser feitas (política). Os governos são reféns de um poder (global) que lhes escapa ao seu efetivo e real controlo!
Caso bem patente é o estado pandémico porque todo o mundo passa. Vemos, cada Estado em palco, dar respostas locais a um problema, quando, na verdade, a resposta deveria ter uma solução global.
E já para não falar nas medidas, não só de caráter profilático, mas, essencialmente, económicas, que devem ser tomadas.
E a resposta que mais sentimos é: - que se avenha. Quando todos nós sabemos que no estado das sociedades em que vivemos, tal como os problemas que temos, a resposta deve ser global.
Particularmente na Europa em que vivemos.
O tempo de confinamento a que fomos sujeitos levou-nos a que puséssemos em dia algumas leituras, que aguardavam nas estantes pela sua sempre adiada vez- E relêssemos outras. Numa das obras - «O Estado de Crise» - de Carlo Bordoni e Zygmunt Bauman, Ao Acaso… relíamos o seguinte, da autoria de Z. Bauman:
“J.M. Coetzee, um dos maiores filósofos vivos entre os romancistas e um dos romancistas mais consumados entre os filósofos, observou no seu Diário de Um Mau Ano que «A questão do porquê de a vida dever ser comparada com uma corrida, ou do porquê das economias nacionais terem de se desafiar umas às outras, em lugar de se unirem numa caminhada de companheirismo, por motivos de saúde, não é levantada. E acrescenta:
‘Mas não foi certamente Deus que fez o mercado; nem Deus nem o Espírito da História. E, se fomos nós, os seres humanos, que o fizemos, porque não podemos desfazê-lo e refazê-lo de uma forma mais simpática? Porque razão tem o mundo de ser um anfiteatro gladiatório onde se mata ou se é morto, em lugar de ser, por exemplo, uma colmeia ou um formigueiro diligentemente cooperativos?’
(…) Devemos ter em mente a pergunta de Coetzee sempre que tentarmos compreender a delicada situação da União Europeia, sempre que quisermos saber como nos metemos nisso e quais são, se houver, as saídas não trancadas para sempre. As necessidades de hoje são apenas restos sedimentados e petrificados das escolhas de ontem – exatamente como as escolhas de hoje originam as verdades emergentes de amanhã”
Palavras bem atuais para os tempos que correm…
E, assim, deixamos hoje aos nossos leitores (trabalhadores) esta reflexão, em Dia Internacional do Trabalhador.