ARQUIVO NACIONAL TORRE DO TOMBO
RESENHA HISTÓTICA - ANTIGO REGIME
2.2.- Antigo Regime
a).- Acervo documental
Não possuímos com verdadeira precisão como, nos seus primórdios, era constituído o seu acervo documental, porquanto não existe informação suficiente sobre a organização e funcionamento da Torre do Tombo que nos habilite para tal.
A partir do século XVI, quando a documentação começa a ser mais abundante, passamos a ter um melhor conhecimento da sua estrutura orgânica e da sua evolução, que nos leva a melhor conjeturarmos sobre o seu acervo.
Inicialmente constituído para conservar a documentação régia, de um modo especial a de caráter fiscal - os Tombos da Coroa ou Próprios da Coroa -, o arquivo da Torre do Tombo passou a guardar diplomas de outras proveniências, funcionando como centro de recolha de documentação que interessava conservar, porque dizia respeito à administração pública. Tal circunstância tinha a ver com a natural complexidade da estrutura governativa e do desenvolvimento do Estado moderno, sobretudo a partir do reinado de D. Manuel I. E daí se explicar a reforma da Torre do Tombo que este monarca empreende e que se traduziu não só na elaboração dos códices da Leitura Nova, mas também nas preocupações com a organização do arquivo, ínsitas no seu testamento e continuadas por seu filho, D. João III.
Assim, com as Descobertas e a formação de um Estado Moderno e Centralizador, em Portugal, “O arquivo régio começa, progressivamente, a transformar-se em arquivo da administração central e, como tal, a ter como função incorporar documentação já desnecessária sob o ponto de vista administrativo, em determinados serviços” (Ribeiro, 1998a, p. 89) e nele posteriormente incorporada documentação proveniente de organismos extintos da administração pública, quer de cartórios privados.
Nesta época, a importância e a segurança atribuídas à Torre do Tombo é tal que membros da nobreza, monarcas, a própria igreja e até países estrangeiros nela colocam, a título de depósito, documentos que consideravam valiosos e cuja conservação desejavam assegurar.
A atestar a importância que a Torre do Tombo tinha como arquivo moderno para a época, está a solicitação de Filipe I (Filipe II de Espanha), em 1583, a Cristóvão Benavente, de lhe elaborar um relatório sobre a Torre do Tombo, que constituiu um elemento fundamental para este monarca constituir o Arquivo Nacional de Espanha, em Simancas.
Mas ao arquivo da Torre do Tombo não ingressavam apenas documentos a título de depósito. Havia lugar a incorporações efetivas importantes. Refere Fernanda Ribeiro que “Numa carta de 15 de Fevereiro de 1549, o guarda-mor Damião de Góis participa à rainha D. Catarina que deram entrada na Torre do Tombo os livros da sua real câmara e fazenda, lamentando o facto de nem todos terem sido entregues e incentivando à sua incorporação” (Ribeiro, 1998a, pp. 86-87).
O caso mais conhecido é o da entrega dos papéis do funcionário régio, Pêro d’Alcáçova Carneiro, em 1569, “os quais «ocupavam perto de 60 caixas, cofres e escritórios e muito pejavam o Arquivo»” (Ribeiro, 1998a, p. 87).
Se é certo que o arquivo da Torre do Tombo foi cada vez mais, com o tempo, «engrossando», no que concerne ao seu acervo documental, também é verdade que esteve sujeito a várias «delapidações», empobrecendo-o.
Em primeiro lugar, temos, quer variados atos de vandalismo, furtos, incêndios, e abandono, desvio de documentos para outros arquivos, particularmente durante os reinados da dinastia filipina, quer destruições causadas por acidentes naturais, entre os quais se destaca o Terramoto de 1 de Novembro de 1755, a Guerra Peninsular e a transferência da Corte para o Brasil (1808-1821), a Guerra Civil, quer ainda a destruição deliberada de documentos feita pelos competentes serviços do Arquivo, porventura sem qualquer princípio de caráter teórico a ela subjacente, e ditada apenas por uma questão de ordem funcional e pragmática, face ao volume incomportável da produção documental dos tempos modernos. Este ato de eliminação, consubstanciado na avaliação, seleção e eliminação de documentos, já vinha desde a época medieval, no tempo de D. Afonso V.
Os livros da Leitura Nova, nos reinados de D. Manuel I e D. João III, entram também neste processo de eliminação do acervo documental.
Em 1532, Tomé Lopes, no «auto de entrega» do arquivo ao guarda-mor Fernão de Pina, verifica-se que os livros originais da chancelaria, dos quais se haviam transcrito ou resumido documentos, já tinham desaparecido da Torre do Tombo. Fernanda Ribeiro, quanto a este ato de «expurgo» informa-nos que “Hoje poderá parecer imperdoável a destruição dos livros que no século XVI haviam sido reputados de «escusados», mas se analisarmos este facto numa perspectiva arquivística, em que a avaliação de acordo com a utilidade administrativa foi o factor determinante para proceder à triagem, não nos parecerá escandalosa a atitude de Tomé Lopes. Ela revela, sim, uma atitude que se pode considerar como muito avançada para a época, uma vez que práticas arquivísticas do género só começam a tornar-se mais vulgares e a ser objecto de regulamentação no século XVIII” (Ribeiro, 1998a, pp. 92-93).
Mas qual era o verdadeiro acervo documental da Torre do Tombo e a forma como o mesmo estava organizado?
Fernanda Ribeiro, na sua dissertação de doutoramento, debruça-se exaustivamente sobre a problemática do que seria o «núcleo primitivo do arquivo» da Torre do Tombo.
Pela nossa parte, ficaremos apenas por uma versão muito mais resumida retirada de um artigo da lavra da mesma autora, que leva o título «Como seria a estrutura primitiva do Arquivo da Casa da Coroa (Torre do Tombo)?» no qual, a determinada altura, nos aborda a questão do seu acervo documental.
A autora, neste artigo, elucida-nos que “O mais antigo testemunho até hoje divulgado, relativo ao «recheio» da Torre do Tombo, data de 2 de Março de 1526 e é uma carta de Tomé Lopes (escrivão servindo de guarda-mor) a D. João III, que constitui uma espécie de descrição do estado do arquivo. Pelo conteúdo dessa carta podemos perceber quais os documentos que até à época se guardavam na Torre do Tombo. Tomé Lopes refere-se à existência de «149 volumes de livros», que se depreende serem de registo da chancelaria, bem como a «37 volumes de livros de 300 folhas cada hum, com suas tavoadas feitas em quatro titulos cada huma», os quais diz estarem «de todo acabados» e a mais 10 outros começados, que facilmente se identificam como sendo os livros de Leitura Nova, mandados fazer no reinado de D. Manuel I “ (Ribeiro, 2003, p. 9).
De Tomé Lopes temos conhecimento de mais dois documentos - de 8 de fevereiro de 1529 e de 28 de agosto de 1532 - pelos quais este escrivão entrega o arquivo ao guarda-mor Fernão de Pina, em cumprimento de ordens régias. No «auto de entrega», que Tomé Lopes apelida de «emvemtayro» “discrimina toda a documentação que se conservava no arquivo, sendo referidos pormenorizadamente os diferentes livros, bem como cartas soltas, rolos e cadernos de pergaminho e papel, quer originais, quer treslados selados e sem selos” (Ribeiro, 2003, pp. 9-10).
Ainda no século XVI, há notícia, de, no tempo do guarda-mor Damião de Góis, se ter elaborado um inventário, do qual nos dá conta Jorge da Cunha, no seu relatório de 1631 sobre a Torre do Tombo, referindo-se deste modo: “E assy faltão Vinte e tantos cofres laurados, e caixas encoiradas, que estauão cheos de papeis, consta de hum pedaço de inuentario feito e assinado por Damião de goes goarda-mor, que foi deste Archivo, que se achou em huma gaueta da casa da coroa, o maes do Inuentario todo falta, que tambem se deuia de leuar” (Ribeiro, 2003, p. 10).
Cristóvão Benavente, em 1583, escreve um relatório, que Fernanda Ribeiro diz ser considerado como um inventário do acervo documental da Torre do Tombo, no qual se encontra uma “descrição bastante minuciosa dos vários livros e documentos avulsos existentes na Torre do Tombo” (Ribeiro, 2003, p. 10), que entrega a Filipe I, a seu pedido.
Em 1622, o guarda-mor Manuel Jácome Bravo também fez um inventário. Neste inventário é referido o Livro de Linhagens do guarda-mor e cronista Damião de Góis. Infelizmente, até à presente data, ainda não foi possível localizar este célebre livro nos instrumentos de pesquisa modernos que descrevem a documentação do «núcleo primitivo» do arquivo.
É de referir, por último, o Alfabeto mistico, de António Dantas Barbosa, elaborado entre 1729-1730, altura em que João Couceiro de Abreu e Castro era guarda-mor da Torre do Tombo. Constituído por dois volumes, no início do segundo inclui um inventário topográfico do Arquivo da Casa da Coroa, composto por 20 armários, referindo Fernanda Ribeiro ser este o último documento coevo que nos elucida como estava organizado o arquivo, vinte e cinco anos antes do terramoto de 1755.
Apesar do levantamento, que acima demos conta, quanto ao acervo documental da Casa da Coroa (Torre do Tombo), o conhecimento preciso daquilo que seria o Arquivo da Coroa (Torre do Tombo) ainda está por fazer. Quer os relatórios de Tomé Lopes, de 1526, 1529 e 1532, publicados por José Pessanha, quer o relatório de Cristóvão Benavente, de 1583, publicado e estudado por António Joaquim Dias Dinis, e também analisado por José Luís Rodríguez de Diego, quer o relatório de Jorge da Cunha, elaborado em 1631, e publicado por Virgínia Rau, quer a correspondência de Damião de Góis com o rei, quer os diferentes inventários, bem como o manuscrito existente na Biblioteca da Ajuda, quer no Alfabeto mistico, quer a correspondência do guarda-mor Manuel da Maia, publicada por Pedro de Azevedo, em O Arqueólogo Português, entre outros, são “apenas um ponto de partida para um trabalho de maior fôlego que deverá ter em conta (...) [estas] fontes referenciadas (...). Um trabalho, sem dúvida, complexo mas deveras aliciante, que os arquivistas da Torre do Tombo — pelo facto de se encontrarem na posição privilegiada de terem ao seu alcance todo o material imprescindível para o efeito — podem concretizar melhor do que ninguém. Assim achem por bem aceitar esse desafio! “ (Ribeiro, 2003, p. 12), por forma a ir-se ao encontro da originária estrutura orgânica do arquivo, sua evolução, desvios a que foi sujeito, conhecendo-se rigorosamente aquele sistema de informação, na sua ampla complexidade.
b).- Instalações e acondicionamento
Existe um documento do século XVII que nos dá conta quanto às divisões interiores da Torre do Tombo - um relatório do escrivão Jorge da Cunha, elaborado em 1631. Virgínia Rau, quando se debruçou sobre este documento, a certa altura, refere: “Segundo êle [Jorge da Cunha], a tôrre tinha dois pavimentos e em cada um quatro salas. No andar de baixo, nas duas primeiras casas, guardavam-se entre outros documentos e papéis de importância «os liuros da casa da India, Armazem, contos, secretaria Vias da India, e liuros da chancelaria del Rej dom João o 3º». Na primeira sala do segundo pavimento era onde se fazia «negocio», isto é, onde iam aquêles que precisavam consultar algum documento ou dêle obter traslado” (Ribeiro, 1998a, p. 99).
Apesar das obras levadas a efeito no reinado de D. João III, a Torre do Tombo, com o tempo, as mesmas vieram a mostrar-se insuficientes para albergar a documentação que se pretendia incorporar. Quando teve de se incorporar o arquivo do funcionário régio Pêro d’Alcáçova Carneiro, em 1569, as 60 caixas com papéis tiveram de ser colocadas no quarto do infante D. Fernando, nos Paços da Alcáçova.
Mas, no rol das preocupações, não era apenas a escassez de espaço. Apesar da robustez da torre, onde estava instalado o arquivo, “a acção do tempo e os abalos sísmicos que, por vezes, se tinham feito sentir em Lisboa - o de 1531 foi particularmente intenso - contribuíram, certamente, para a fragilizar” (idem, 1998a, p. 99).
c).- Pessoal
Segundo João Pedro Ribeiro, referido por Fernanda Ribeiro, o Arquivo, no início, estava sob a responsabilidade do Vedor da Fazenda, João Anes (cerca de 1387), e que é comumente considerado como o seu primeiro guarda-mor.
Fernão Lopes vem em quatro na lista, como guarda-mor da Torre do Tombo. Não sabemos da data da sua nomeação, mas aparece referido como «guardador das escripturas do tombo», num documento de 1418.
Fernanda Ribeiro, citando António Baía, diz que é precisamente “com Fernão Lopes que o arquivo adquire autonomia, isto é, passa a ter serventuários próprios” (Ribeiro, 1998a, p. 103).
No tempo de Fernão Lopes foram, por este, extraídas muitas certidões autenticadas, das quais se salientam as do conhecido «Livro Grande», um códice pergamináceo existente no Arquivo Histórico Municipal do Porto.
Sucede a Fernão Lopes Gomes Eanes de Zurara que, tal como o seu antecessor, acumulou as funções de cronista-mor do Reino, tal como, entre outros depois, Rui de Pina, Fernão de Pina, Damião Góis e António de Castilho.
Entretanto, começamos depois a encontrar referência a escrivães que passam certidões e, no tempo de D. Afonso V, “já o Real Archivo tinha Escrivão particular” (Ribeiro, 1998a, p. 104).
Com a criação da Cadeira de Ortografia Diplomática, no Arquivo da Torre do Tombo, em 1775, por iniciativa de Fr. Manuel do Cenáculo, e, mais tarde, com o estabelecimento de uma Cadeira de Diplomática, anexa à Universidade de Coimbra, mas que, depois, em 1801, o lente de Diplomática Portuguesa passa para o Arquivo da Torre do Tombo, este Arquivo passa a ter ao seu dispor Oficiais e Escriturários que só eram admitidos se provassem, pelo menos, terem frequentado, ao menos um ano, com aproveitamento, a Aula de Diplomática.
Elucida-nos Fernanda Ribeiro que a Torre do Tombo, segundo João Pedro Ribeiro, nas suas «Memórias authenticas para a história do Real Archivo», de 1387 a 1753, os funcionários do Arquivo Real variavam, em número, conforme os tempos e as necessidades do serviço, tendo por ele passado desde guardas-mores; escrivães; guardas; porteiros; varredores; oficiais para a reformação; escreventes; ajudantes de escrivão; oficiais papelistas; livreiros, amanuenses, etc..
A título de exemplo, no reinado de D. João V, com a saída dos decretos de 16 e 18 de março de 1719, uma vez que o Arquivo deveria fornecer cópias de todos os documentos solicitados pelos sócios da Real Academia da história Portuguesa, foi necessário aumentar o pessoal do Arquivo e, deste feita, “foram nomeados oito “officiaes de reformação para o Real Archivo, por um anno (...)” (idem, 1998a, p. 104).
d) Organização do serviço
Como funcionava o arquivo da Torre do Tombo?
É, uma vez mais, o testemunho de Tomé Lopes que nos elucida sobre esta questão, pois, segundo uma sua carta dirigida ao rei D. João III, em 1526, “o que fazia na Torre do Tombo era de acordo com as ordens que recebera de D. Manuel I” (Ribeiro, 1998a, p. 108).
A dado passo daquela carta, diz: “fiz de todo este regimento, que a V. A. invio, conforme em algumas cousas, ao que do costume antigo mais pude alcançar, e em outras ao que me pareceo necessario...” (Ribeiro, 1998a, p. 109).
O «regimento» de que nos fala Tomé Lopes, na verdade, não constitui um diploma regulamentar, mas tão-somente nos dá conta sobre a prática arquivística da época.
Foi necessário chegar ao século XIX para encontrarmos normas relativas à organização do serviço da Torre do Tombo.
Cristóvão Benavente, no relatório elaborado a pedido de Filipe I (Filipe II de Espanha), datado de 1583, também nos ajuda no conhecimento da organização do serviço da Torre do Tombo. (Este relatório manuscrito com a designação de «Memorial das cousas tocantes a torre do tombo que ffez o lecençeado Xpõuão de Beneuente escriuão della pera V. S. Mgde ver» encontra-se na Biblioteca Nacional de Madrid).
O relatório de Cristóvão Benavente, além de constituir uma espécie de inventário da documentação existente no arquivo, como já acima referimos, aborda alguns aspetos sobre o funcionamento do mesmo, quando fala nos “cartórios que nele deviam ser incorporados, a forma como se executavam as certidões - sempre a partir dos traslados, desde que os houvesse, e não dos livros originais” (Ribeiro, 1998a, p. 110) e ao pessoal que nele trabalhava e respetivos ordenados.
José Luís Rodríguez Diego, num artigo que publicou sobre o mais antigo diploma orientador do funcionamento de um arquivo de Estado - o de Simancas, Espanha -, afirma claramente que o «memorial» de Cristóvão Benavente constitui a base essencial para a elaboração da «Instrucción para el gobierno del Archivo de Simancas».
Segundo refere Fernanda Ribeiro, Diego de Ayala, arquivista a quem se deve verdadeiramente a fundação do Arquivo de Simancas, e um dos redatores do regulamento do mesmo arquivo, quando esteve em Madrid, nos anos de 1583-1584, deu a sua opinião ao rei sobre a Torre do Tombo e «lo que convernia imitar en el archivo de Simancas»” (Ribeiro, 1998a, p. 111).
Os reinados de D. Manuel I, e de seu filho, D. João III, com as reformas que no Arquivo da Torre do Tombo se fizeram, representaram um período áureo do Arquivo Real. Logo a seguir, principalmente na dinastia sob o domínio filipino, mercê da incúria e abandono, foi um período demasiado pernicioso para a preservação do seu rico acervo documental e, inclusive, para a própria organização do serviço. Disso nos dá conta, em 1631, o relatório do escrivão, e guarda-mor interino, Jorge da Cunha, publicado por Virgínia Rau, avaliando, desta feita, cinquenta anos depois, o estado deplorável em que a Torre do Tombo se encontrava (Ribeiro, 1998a).
Ao período de abandono a que esteve sujeita a Torre do Tombo, sucedeu depois uma nova era de preocupação e cuidado, logo após a Restauração, traduzindo-se numa verdadeira reforma do Arquivo.
Refere Fernanda Ribeiro que “A necessidade de pôr em ordem o acervo documental e de criar meios eficazes para o tornar acessível levou D. Pedro II, em 30 de Maio de 1675, a expedir um alvará a D. António Alves da Cunha, nomeando-o reformador do arquivo, com amplos poderes para executar quanto lhe parecesse útil, a fim de o melhorar. Neste mesmo ano, segundo Pedro de Azevedo e António Baião, há notícia de ter sido reformado o regimento da Torre do Tombo, embora não se conheça o documento” (Ribeiro, 1998a, p. 114).
Mas a reforma do Arquivo não teve apenas em vista a preservação dos documentos e a regulamentação das condições de acessibilidade. Traduziu-se também na preocupação de criar meios de acesso à informação, com a elaboração de sumários, índices e inventários de variadas espécies arquivísticas.
Com a indigitação de Manuel da Maia para guarda-mor, em 12 de fevereiro de 1745, o trabalho de reforma iniciado no século anterior continuou, e com mais afinco. Este guarda-mor conhecedor do que na área se fazia lá fora, e imbuído do espírito Iluminista, começou por definir novos métodos para a realização de trabalhos arquivísticos, principalmente no que respeitava à organização dos índices. Fernanda Ribeiro, quanto a este labor, diz que “Em 1749, quando elaborou os índices de 71 volumes da chancelaria de D. João III, [Manuel da Maia] criticou o processo até aí usado na produção destes instrumentos de pesquisa e pronunciou-se a favor de reformas ‘assim no material como no formal’. Acrescenta ainda: «... como não achasse neste Archivo, nem podesse descobrir fora delle, regimento proprio e nacional por onde me houvesse de guiar, me foi preciso ir fazendo observações e ponderando os estylos que nelle se usão e comparando-os com os de que tenho alguma noticia se observam em outros paizes com bem fundadas leis, ir formando para mim o regimento que me parecesse mais apropriado»” (Ribeiro, 1998a, pp. 114-115).
O terramoto de 1 de novembro de 1755
A reforma do Arquivo, que se ia paulatinamente consolidando, sofreu um «golpe fatal» com o terramoto de 1755.
Apesar deste rude golpe para a documentação mais representativa de um reino, pondo em verdadeiro frangalho todo o acervo nele depositado, aquele acidente natural não destruiu a grande maioria do seu acervo: a torre albarrã, situada na parte mais alta da cidade - o Castelo de S. Jorge, em Lisboa -, não foi atingida pelo maremoto e, quando a torre desabou, os seus destroços caíram e abafaram todo o acervo documental, salvando-se dos incêndios que, entretanto, iam sucedendo por toda a parte de Lisboa.
Aqui a dedicação e o carinho do guarda-mor Manuel da Maia foram essenciais e decisivos para a preservação deste valioso património guardado na Torre do Tombo. De imediato, este zeloso guarda-mor, com o material dos destroços da torre albarrã que ruiu, na Praça de Armas do Castelo de S. Jorge, mandou construir uma barraca, mandado depositar nela toda a documentação saída dos escombros daquela torre.
Naquela barraca, todo o acervo da Torre do Tombo ali permaneceu, durante dois anos, até que, em 1757, foi transferido para o Mosteiro de São Bento da Saúde, atual Palácio de S. Bento, sede da Assembleia da República Portuguesa, do lado da Calçada da Estrela, ocupando as instalações designadas por Casa dos Bispos e compartimentos contíguos, dependências estas arrendadas ao mosteiro.
Imagem III - Palácio de São Bento do lado da Calçada da Estrela
![Imagem III - Palácio e S. Bento do lado da Calçada da Estrela Imagem III - Palácio e S. Bento do lado da Calçada da Estrela]()
Cópia da aguarela atribuída a J. Lewicki, 1853-1859
Fonte:- Leitão, 1945, p. 17
Com esta catástrofe e mudança de lugar, o Arquivo Real ou da Coroa não perdeu a sua identidade ou designação primeva - continuo a chamar-se da «Torre do Tombo», mas foi objeto de um imenso e insano labor de reestruturação do seu acervo documental e de organização do serviço, para além de novos equipamentos para o instalar, com muitos armários e prateleiras e serem laboriosamente construídas com madeira vinda do Brasil. E, nesta enorme tarefa, mais uma vez se distingue e destaca o célebre guarda-mor Manuel da Maia!
Informa-nos criticamente Fernanda Ribeiro que “Em pleno século das luzes, as concepções iluministas tiveram influência nos critérios adoptados para a reestruturação. A primitiva ordem dos documentos e das séries arquivísticas perdeu-se com o desmoronamento e no meio dos escombros a documentação ficou numa completa balbúrdia. Grande parte dos livros sofreram danos nas encadernações, que se desfizeram, levando à separação de cadernos e folhas, e os documentos avulsos ficaram desprovidos da ordenação que tinham. Infelizmente, a reconstituição não procurou recuperar a ordem original, antes se pautou por métodos “em moda” na época, ou seja as classificações metódicas, de base intelectual e não orgânica. Assim nasceram colecções de documentos, ordenadas cronologicamente, segundo uma perspectiva que privilegiava já, em grande medida, o valor histórico dos mesmos. O Corpo Cronológico, colecção constituída por 525 maços que agrupam 82.902 documentos, foi essencialmente formado pelos “papéis” de Pêro de Alcáçova Carneiro, incorporados na Torre do Tombo em 1569. Este é um exemplo paradigmático da desestruturação de um arquivo por força da aplicação de um método de ordenação absolutamente anti-natural” (Ribeiro, 1998a, pp. 115-116).
Para além do Corpo Cronológico, outro exemplo é a coleção o Bullarium “formada pelos documentos pontifícios (bulas, breves e outros diplomas) que se achavam nas Secretarias de Estado e que Manuel da Maia fez incorporar no arquivo em 1751 ou a colecção Cartas Missivas, constituída por 1.717 originais quinhentistas, em que foram misturados vários tipos de documentos como ordens régias, petições, mandados, notas avulsas, etc.” (Ribeiro, 1998a, p. 116).
Miranda Rebelo, um amanuense da Torre do Tombo, em carta-memorando escrita à Rainha D. Maria I sobre o Arquivo, queixava-se da inexistência de um regimento, o que, no seu entender, era causa de inúmeros abusos, deixando tudo ao livre-arbítrio dos guarda-mores. E, nessa mesma carta-memorando dava sugestões de como se deveria dar nova forma ao Real Arquivo. As preocupações desta amanuense iam para as incorporações, a classificação e ordenação dos documentos, a organização do serviço e pessoal e a despesa a ter com a nova reorganização.
Foi preciso, entretanto, chegarmos a 1802 para que a progressiva reorganização do Arquivo, que se traduziu na produção de instrumentos destinados a recuperar a informação, para se dar À luz o primeiro regulamento do Arquivo da Torre do Tombo.
Os relatórios de Tomé Lopes e Cristóvão Benavente, bem assim outros que se lhes seguiram, apenas testemunham «o que era uso praticar», não representando, por isso, qualquer diploma regulador da prática arquivística.
Deixa-se aqui transcrito, pelo seu valor histórico, o aludido regulamento, inédito, segundo Fernanda Ribeiro, até à data da publicação da sua dissertação de doutoramento:
“Ordens que se devem observar neste Real Archivo daqui em diante
Primeiro - De todos os documentos, de que actualmente se estão extrahindo copias, devera fazer hua relação, e nella expecificados o trabalho de cada hum doz individos em particular; esta deverá ser feita pelos officiaes da Reforma, e assinada por elles.
2º - Todos os titulos, ou documentos, que actualmente se estão confiando os respectivos officiaes, a quem a dita copia for confiada, serão obrigados logo que sessar o trabalho diario de os fazer entrar na Caza da Corôa, não se permittindo que fique fora da dita Caza, nem nas mãos dos ditos officiaes.
3º - Ficão nomeados para o registo tanto das ordens geraes, como particulares deste Archivo dois officiaes Sebastião da Costa Ferrão, Joaquim Joze Bernardino, Candido Jozé, Bernardo Joze de Figueiredo, e Luiz Pinto Varela.
4º - As chaves do Archivo não poderá por modo algum serem entregues a outro qualquer official à excepção dos dois officiaes da Reforma, os quaes simultaniamente se deve ajudar hum ao outro, ficando lhe igualmente encarregado a busca dos titulos, tanto em beneficio das partes como do Rey, e igualmente receberão recibo de qualquer individo do titulo que for tirar a fim de se conservar a responsabilidade.
5º - Todos os officiaes não recuzarão por modo algum em satisfazer ao que lhe for mandado pelos doiz officiaes de Reforma sendo responsaveis que em contrario obrarem. 6º - Em todos os armarios se porão bocados de camfora, e solas, a fim de se evitar as larvas dos incetoz.
7º- Os dois officiaes de registo juntos com oz dois continos, ou porteiro, e official mais moderno farão avizar de oito em oito dias os Armarios fazendo sacudir e alimpar o pó.
8º - Não se consentirá a entrada de individo algum nas cazas dos armarios, sem ordem expressa do guarda mor; isto se entenda pelo que toca aos individos de fora; porquanto os officiaes deverão entrar h ua vez chamados pelos ditos officiaes da Reforma, ou Lente de Plumatica [i. e. Diplomática] lhe será permetida a entrada. Esta ordem se cumprirá, e se registará em hum registo particular, que deve ser feito, para o governo economico para este Real Archivo. Torre do Tombo nove de Outubro de mil oitocentos e dois. Com huma rubrica do guarda mor interino” (Ribeiro, 1998a, pp. 118-119).
e).- Acesso à informação
Instalado o Arquivo na Torre do Tombo, a função serviço foi imediatamente assumida, porquanto a documentação era usada para fins informativos e probatórios. Quer dizer, portanto, que a função do Arquivo não era apenas custodial e de preservação de documentos (ou testemunhos documentais).
No sentido da prossecução da função serviço, houve, desde cedo, a necessidade de se criar meios ou instrumentos que tornassem mais rápido e eficaz o acesso à informação que se procurava.
Embora a terminologia no que concerne aos meios ou instrumentos de acesso à informação tenha, ao longo do tempo, variado, os conceitos permaneceram praticamente inalterados, diz-nos Fernanda Ribeiro (Ribeiro, 1998a).
No período medieval, vamos encontrar os registos (século XIII).
Os sumários, como cópia resumida das escrituras exaradas nos registos antigos de chancelaria para novos livros, em rigor, não podem ser encarados como instrumentos de acesso à informação, pois foram, acima de tudo, uma forma de deixar registada a efetivação de um ato administrativo ou jurídico.
Só no século XVI, com D. Manuel I, é que aparecem os primeiros instrumentos destinados à recuperação da informação com os célebres índices da Leitura Nova. Com propriedade, estes são os mais antigos instrumentos de acesso à informação da Torre do Tombo, que, na altura, não tinham esta designação, mas sim de «tavoadas». Todavia, os índices dos livros que se conhecem na Torre do Tombo nesta altura não obedeciam todos ao mesmo tipo ou estrutura. Fernanda Ribeiro indica-nos que “Há ´índices meramente topográficos, ou seja, uma simples relação dos documentos indicados no livro, pela sua ordem sequencial, há índices de assuntos e, nos livros mais modernos, têm já uma ordenação alfabética, o que denota maior sistematização” (Ribeiro, 1998a, pp. 120-121).
Diz-nos ainda Fernanda Ribeiro que “os índices da Leitura Nova, feitos no início do XVI, apesar das incoerências e da falta de consistência dos critérios que lhe estão subjacentes, contêm já elementos essenciais que irão caracterizar os instrumentos de pesquisa dos tempos mais modernos” (Ribeiro, 1998a, p. 121).
Como já verificámos acima, datam também do século XVII «a relação dos documentos» existentes na Torre do Tombo, considerados como os primeiros inventários da Torre, elaborados pelo escrivão Tomé Lopes, em 1526. Da mesma forma que o inventário de Damião de Góis, referido por Jorge Cunha, em 1631, bem assim o relatório de Cristóvão Benavente, em 1583. As preocupações daqueles instrumentos iam mais no sentido da descrição, o mais minuciosa possível, dos documentos (livros e documentos avulsos) existentes na Torre do Tombo do que propiciar o acesso à informação, dando-nos conta também sobre a situação do Arquivo e da organização do seu acervo. Em rigor, a identificação do acervo documental - inventário - não pressupõe uma finalidade de recuperação da informação tal como hoje em dia lhe atribuímos.
No relatório de Jorge da Cunha, de 1631, quando este escrivão descreve o estado do Arquivo, nele o autor nos dá conta da sua ação no que se refere à elaboração do inventário, índices e transcrição de documentos.
Contudo, segundo Fernanda Ribeiro, só apenas um índice é indubitavelmente da sua lavra, nas palavras de Silva Marques (1935), no seu Index indicum - «o Indice dos 51ᵒˢ de Alem Douro, 3 da Beira e 8 de Odiana» (Ribeiro, 1998a, p. 124).
Logo a seguir a Jorge da Cunha, o interesse em elaborar índices e inventários é prosseguido por Manuel Jácome Bravo, quando é nomeado guarda-mor, em 1632.
Na segunda metade do século XVII, prossegue-se com a reforma do Arquivo. E é neste sentido que, por Alvará de 30 de maio de 1675, D. António Alves da Cunha é nomeado reformador do Arquivo com o fim de o «por em ordem». Com este reformador, vêm dois clérigos seculares «para escrever na Reformação. Informa-nos Fernanda Ribeiro que a D. António Alves da Cunha é-lhe concedida a jurisdição “em ordem a obrar tudo o que julgar mais conveniente (...) [e] fazer inventário dos livros encadernados, papeis soltos, novos índices e procurar restituir o que faltar...” (Ribeiro, 1998a, p. 126).
Entre os anos de 1692 e 1695, foram elaborados três volumes de índices dos livros da Leitura Nova.
Em 1699, da autoria de Fr. Simão de São José, e no tempo do guarda-mor José de Faria, foi feito um índice dos livros da chancelaria de D. Afonso VI, em dois volumes (Ribeiro, 1998a).
A criação da Academia Real da História Portuguesa, por Decreto de 8 de dezembro de 1720, aumentando exponencialmente a consulta de documentos, até então extremamente restrita e exígua, e a consequente necessidade de copiar os que era de interesse para os académicos, contribuiu para que se incentivasse a produção de instrumentos de pesquisa (instrumentos de acesso à informação).
A intensa atividade arquivística, ainda segundo o Index indicum, de Sila Marques (1935), corresponde ao período em que João Couceiro de Abreu e Castro fora guarda-mor, onde “podemos identificar 43 instrumentos de acesso à informação”, mas, já naquela data, sem qualquer utilidade prática, diz aquele autor (Ribeiro, 1998a, p. 129).
O mais importante dos instrumentos de acesso à informação (pesquisa) é o Alfabeto mistico, de António Dantas Barbosa, em dois volumes, realizado entre 1729 e 1730. Quanto a este Alfabeto mistico, enfatiza Fernanda Ribeiro, apesar das críticas ao mesmo feitas por Silva Marques, “sendo, genericamente, um índice relativo a diversa documentação, tem, no entanto, a particularidade de incluir, no início do volume dois, um inventário topográfico do Arquivo da Casa da Coroa, à época composto por vinte armários (...) A partir dele ficamos a conhecer o modo como estava organizado o arquivo, vinte e cinco anos antes do terramoto” (idem, 1998a, p. 129).
Em 1745, como já referido também, é nomeado o engenheiro Manuel da Maia (coautor do projeto do Aqueduto das Águas Livres, de Lisboa) para guarda-mor do Arquivo. Para além do hercúleo esforço para a recuperação do acervo documental, com o terramoto de 1755, e a preocupação em encontrar lugar condigno e instalar o Arquivo da Torre do Tombo, este incansável homem continuou com a reforma do Arquivo que já vinha dos seus antecessores.
Sumariamente vamos indicar os mais importantes documentos de acesso à informação feitos sob a sua responsabilidade (e por si próprio, alguns): o índice do Corpo Cronológico, coleção formada após o terramoto, em 1764; o índice dos documentos da Gavetas (dois volumes) e o índice dos quinze livros das Ementas (1765); o índice alfabético de dez maços de Moradias da Casa Real, em 1767; outro em 4 volumes, de 46 livros das chancelarias de D. Sebastião e D. Henrique (1767); continuação da “reforma dos índices nas Chancellarias d’El Rey D. Filipe 3º e dos senhores Reys D. joão 4º e D. Pedro II e findas ellas se lhe devem seguir as anteriores à do senhor Rey D. Sebastião, que igualmente carecem do mesmo beneficio” (Ribeiro, 1998a, p. 130).
Como podemos verificar, o esforço despendido no Arquivo foi sempre no sentido, em termos de meios de acesso à informação, na criação de índices de séries arquivísticas ou de coleções factícias de documentos avulsos.
Existe a ideia generalizada que todo o esforço era, contudo, mais virado para a produção de índices parciais, faltando, desta feita, um instrumento global, permitindo não só controlar como identificar todo o acervo documental do Arquivo.
Tal obra veio a concretizar-se, em 1776, com o guarda-mor João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho e o seu «Inventário de livros, maços e documentos que se guardam no Real Archivo da torre do Tombo», que José Feliciano de Castilho o considera como “«genérico e superficial» e de «mui fraco auxílio»” (Ribeiro, 1998a, p. 132).
Opinião diferente tem Fernanda Ribeiro quando, reportando-se aos inventários de Manuel Jácome Bravo (1625) e o de Dantas Barbosa (1729-1730), diz estes terem um caráter «general» e, consequentemente, anteriores à elaboração do inventário de João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho.
No início do século XIX, João Pedro Ribeiro elaborou uma espécie de guia geral da Torre do Tombo - «Estado actual do Archivo». Ao ler esta obra, fica-se com a sensação “que João Pedro não teve conhecimento do inventário geral do tempo do guarda-mor Azeredo Coutinho, nem do que elaborara Dantas Barbosa, pois não os refere” (Ribeiro, 1998a, p. 141).
Adianta Fernanda Ribeiro que “A avaliar pelas afirmações de João Pedro Ribeiro, chega-se ao século XIX sem um instrumento capaz de identificar e permitir o acesso ao conjunto da documentação custodiada no arquivo geral do Reino” (Ribeiro, 1998a, p. 142). Frisa, contudo, esta autora que, todavia, quer o inventário de António Dantas Barbosa, quer o de João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho não se haviam perdido, (embora João Pedro Ribeiro não tivesse acesso a eles), encontrando-se atualmente na Torre do Tombo, apesar da sua pouco utilidade prática, uma vez que a colocação dos documentos foi, particularmente com o terramoto de 1755 e a consequente mudança de instalações para o Convento de S. Bento da Saúde, sendo profundamente alterada.
São, contudo, elementos preciosos, sublinha Fernanda Ribeiro, para servir de base e ter em conta num estudo sobre a estrutura orgânico-funcional da Torre do Tombo, antes da avalanche das incorporações, após o Liberalismo.
O Fundo Antigo da Torre do Tombo, ou seja, todo o património documental da Torre do Tombo anterior à transição do Regime Absoluto para o Constitucional “só poderá ser verdadeiramente conhecido e reconstruído na sua estrutura orgânica, com o auxílio de instrumentos de acesso à informação elaborados na época” (Ribeiro, 1998a, p. 142), conclui a autora que vem sendo a nossa guia nesta resenha histórica, porquanto “As “reorganizações” posteriores ao liberalismo adulteraram muito o sistema de informação que, ao longo de mais de quatro séculos, se havia constituído e consolidado num quadro de evolução perfeitamente natural. Os interesses arquivísticos haviam sempre prevalecido sobre quaisquer outros, determinando a estrutura organizativa, em que se inclui a função serviço/uso, veiculada em grande medida através dos instrumentos de acesso à informação” (idem, 1998a, p. 142), acima referidos.
Fernanda Ribeiro, na Parte II da sua dissertação, quando especificadamente se refere aos instrumentos de acesso à informação, agora já não se referindo especificadamente ao Arquivo Nacional Torre do Tombo, mas, a todos os arquivos portugueses, e até à atualidade, ou seja, ao ano da apresentação da sua tese, a autora apresenta-nos a seguinte figura dos tipos de instrumentos usados no acesso à informação:
FIGURA I
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Fonte:- Ribeiro, 1998b, p. 51
Em conclusão, e olhando para as diferentes funções e atividades desenvolvidas no Arquivo da Torre do Tombo neste período, e na perspetiva de Vivas Moreno, referido por Mariana Lousada, destacamos as características que nos parecem particularmente mais importantes no que concerne à arquivística: a) o arquivo como instrumento de base para a organização administrativa do Estado; b) o arquivo como mais um dos mecanismos de poder das monarquias, no sentido de um melhor domínio e controlo; c) o melhoramento das técnicas arquivísticas ao serviço de uma mais eficaz administração (Lousada, 2015).