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zassu

31
Dez17

Poesia e Fotografia 544

 

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

 

CRÓNICA

 

Um preito de meus Pais
A mais
À natureza,
E eu nasci
Como um cabrito
Ou como um pé de milho.
Mas minha Mãe adivinhou no filho
Um futuro poeta. Secreta,
Não o disse a ninguém.
Eu é que em vez de me calar também,
Quando cresci,
Cedi
À tentação
De erguer na solidão
A voz dorida.
E chamei sobre mim a maldição
Da própria vida.


Coimbra, 19 de Julho de 1984

7417096558_b4efbc76a7_b.jpg

30
Dez17

Poesia e Fotografia 543

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

VESPERAL


E, contudo, é bonito
O entardecer.
A luz poente cai do céu vazio
Sobre o tecto macio
Da ramagem
E fica derramada em cada folha.
Imóvel, a paisagem
Parece adormecida
Nos olhos de quem olha.
A brisa leva o tempo
Sem destino.
E o rumor citadino
Ondula nos ouvidos
Distraídos
Dos que vão pelas ruas caminhando
Devagar
E como que sonhando,
Sem sonhar…


Coimbra, 28 de Abril de 1984

tree-476341_960_720.jpg

29
Dez17

Poesia e Fotografia 542

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOSD DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

ASSENTO


O nómada inconfesso
De regresso
Ao lar.
Todo o bom senso a recomeçar,
Todas as horas habituais,
Todos os sentimentos naturais,
Todos os sonhos pertinentes.
E cada vez mais presentes
Na imaginação
Os insólitos modos e feições
Das míticas nações
Por onde se aquietou a inquietação
Liberta e clandestina,
Cansada das felizes emoções
Da rotina.


Coimbra, 20 de Março de 1984

Nómada.jpg

28
Dez17

Poesia e Fotografia 541

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

OCASO


Parado num calendário asteca,
O tempo configura a própria eternidade
Sem duração.
Em total comunhão
Com tudo que vivia,
Outrora decorria
Ao ritmo de inquietos corações
E pulsava também nos glifos do basalto.
Agora, aqui, na sala de um museu,
Onde cada lembrança lembra a morte,
Adormeceu num somo tumular.
E não há voz horária
Capaz de o acordar
Da lousa funerária
Que foi pedra solar.


Cidade do México, 14 de Março de 1984

598dae7e33527_Piedra_del_Sol._Museo_Nacional_de_An

27
Dez17

Poesia e Fotografia 540

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

DEUSES


Terríveis vos senti sempre
Na imaginação.
Mas faltava-me a pânica emoção
De ver o vosso rosto verdadeiro,
Máscara desumana,
Sem possível piedade refletida
No riso alvar e no olhar vazio.
Retratou-vos, temente, um trágico canteiro
A macerar na pedra os próprios pesadelos.
E é na mão do tempo corrosivo
Que confia
Quem, mortalmente vivo,
Vos desafia.

 

 

Uxmal, México, 9 de Março de 1984

uxmal-ruins.jpg

26
Dez17

Poesia e Fotografia 539

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

 

ARTE POÉTICA


Fecho os olhos e avanço.
E começa o poema.
Rodeiam-me os fantasmas
Fugidios
Dos versos que persigo.
A regra é caminhar
E chegar sem saber.
De tal modo é cruzada
A encruzilhada
Onde o milagre pode acontecer.


Mas sendo, como é, de cabra-cega
O jogo,
E é um destino jogá-lo,
É sempre incerto que o princípio.
Tacteio no vazio
Da expressão,
Vou seguindo,
Seguindo,
E ganho quando sinto a salvação
No próprio gosto de me ir iludindo.


Coimbra, 1 de Março de 1984

9938390_orig.jpg

24
Dez17

Poesia e Fotografia 538

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

NATAL


Ninguém o viu nascer.
Mas todos acreditam
Que nasceu.
É um menino e é um Deus.
Na Páscoa vai morrer, já homem,
Porque entretanto cresceu
E recebeu
A missão singular
De carregar a da nossa redenção.
Agora, nos cueiros da imaginação,
Sorri apenas
A quem vem,
Enquanto a Mãe,
Também,
Imaginada,
Com ele ao colo,
Se enternece
Os corações,
Cúmplice do milagre, que acontece
Todos os anos e em todas as nações.


Coimbra, 25 de Dezembro de 1983

Mangiatoia_di_Natale.gif

23
Dez17

Uma vida a celebrar a Vida

 

 

UMA VIDA A CELEBRAR A VIDA

 

Missa Nova Padre Hélder de Sá.jpg

 

50 anos nos separam desta imagem.

 

No dia da tua Missa Nova, deste início a um novo Caminho, na senda do Deus feito Homem.

 

Durante estes 50 anos, todos os dias, nas diferentes comunidades que serviste, tomaste da Palavra e, erguendo o cálice, celebraste o nascimento, a vida, a paixão, a morte e a ressurreição do Deus-Homem, que decidiste seguir.

 

De há 50 anos para cá, meu caminho foi diferente.

 

Mas não esqueci os ensinamentos, verdadeiramente humanistas, que o Deus feito Homem deixou como legado na História dos Homens e que nos foram transmitidos na mesma instituição pela qual passámos.

 

Há 50 anos estive presente fisicamente, erguendo a taça para celebrar a tua nova caminhada, como sacerdote, e o casamento do teu irmão.

 

Hoje, na impossibilidade de estar presente, na Festa Comemorativa e de Homenagem do teu múnus sacerdotal, com a Comunidade Flaviense, de Santa Maria Maior, a quem serves, quero, aqui em espírito, erguer essa mesma taça, desejando que continues pisando os trilhos do Caminho e da Verdade e que continues a celebrar a Vida, meu querido amigo Padre Hélder Sá.

 

Um forte abraço do


António de Souza e Silva

17
Dez17

Poesia e Fotografia 537

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

MEMÓRIA


De todos os cilícios, um, apenas,
Me foi grato sofrer:
Cinquenta anos de desassossego
A ver correr,
Serenas,
As águas do Mondego.


Coimbra, 1 de Novembro de 1983

Coimbra_e_o_rio_Mondego_(6167200429).jpg

16
Dez17

Poesia e Fotografia 536

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

RESGUARDO


Quero-te num poema.
Viva e transfigurada,
Sentada
No banco dum jardim
De versos outonais,
A ver nos horizontes irreais
Sumir-se o tempo, o burlador
Do amor,
Que diz que volta, mas não volta mais.


Chaves, 12 de Setembro de 1983

caldas_5.jpg

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