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02
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 40

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

 

 

B.- BREVE ABORDAGEM ÀS OUTRAS FRENTES

 

 

Esclarece-se o leitor que a presente «Breve abordagem às outras frentes» resume, de alguma forma, a organização e, essencialmente, as leituras feitas ao conteúdo das obras de Martin Gilbert e Norman Stone, constantes da bibliografia apresentada e citada, bem assim os múltiplos artigos de David Martelo, constantes da compilação «Portugal e a Grande Guerra - 1914.1918», coordenada por Aniceto Afonso e Carlos de Matos Gomes.

Gilbert (2007: 808, nota 11), refere as seguintes Frentes: Ocidental; Oriental; Galípoli; Mesopotâmia; Frente do Cáucaso; Frente Sérvia; Frente Ítalo-austríaca; Frente de Salónica. De uma forma intermitente, refere ainda, que se lutava na África Oriental, na África Central (Camarões) e na Pérsia.

Pela nossa parte apenas iremos abordar, de uma forma sucinta quanto possível, as seguintes frentes, para além da Frente Ocidental, a que demos mais destaque: Frente Oriental (Prússia Oriental, Galícia, Polónia, Cárpatos e Cáucaso); Balcãs (Sérvia, Bulgária, Roménia e Salónica); Frente do Sudeste Europeu e Médio Oriente (Turquia, Galípoli, Mesopotâmia, Cáusaco e Pérsia) e Frente Italiana. Faremos ainda uma brevíssima referência à zona do Pacífico e África (Colónias) e terminaremos nos Mares.

 

4.- Frente Oriental

 

4.1.- 1914

 

A Frente Oriental, com quase 1. 500 Km, tinha o dobro do comprimento da Frente Ocidental, e com muitos menos homens.

Em princípio, a Rússia deveria ter podido contar com inúmeros milhões de homens. A sua população, com 170 milhões de pessoas, era o dobro das da Alemanha e da Áustria-Hungria juntas. Mas os conscritos custavam dinheiro e o orçamento de guerra russo não chegava para alimentar e uniformizar mais de um quarto dos recursos humanos disponíveis. O exército russo de primeira linha, com 5 milhões de homens, não era maior que o alemão. Na Frente Oriental existiram geralmente 90 divisões russas contra 80 alemãs e austro-húngaras. Eram 1 500 russos por quilómetro quadrado e meio de frente.

Os franceses tinham depositado grandes esperanças numa vitória russa. E os russos, tal como tinham prometido, invadiram a Prússia Oriental, com cerca de 30 divisões.

Os alemães dispunham de ferrovias no sentido este-oeste; os russos só podiam avançar a pé, a partir de Grodno ou Varsóvia, arrastando-se pelas poeirentas estradas de agosto. Para além disso, as comunicações russas eram muito deficientes: os telegramas tinham de ser trazidos de automóvel de Varsóvia; as ordens eram transmitidas via rádio, mas sem codificação, logo, as informações eram facilmente percebidas pelos alemães, ficando estes facilmente ao corrente do que se passava nos exércitos russos. Uma grande vulnerabilidade!

A Alemanha contava com a lenta mobilização russa. Daí, a sua estratégia era de atacar em força na Frente Ocidental (Bélgica e França), ficando apenas de alerta para qualquer eventualidade quanto a ofensivas russas. Mas os russos iniciaram a sua ofensiva mais cedo do que os alemães contavam.

 

a).- Prússia Oriental

 

A 17 de agosto de 1914, o 1º exército russo, comandado por Rennenkampf, iniciou a sua movimentação em direção à região de Insterburg, onde esperava encontrar forças alemãs; o 2º exército, de Samsonov, progredia para sul dos Lagos Masúrua para, num movimento envolvente por norte, atacar, pela retaguarda, os alemães.

O dispositivo alemão era constituído pelo 8º exército, do general von Prittwitz, constituído por 4 Corpos de Exército, uma divisão de cavalaria, a guarnição de Könisberg (Kalinegrade) e algumas brigadas territóriais. Moltke, o Jovem, deu ordens para não se deixarem empurrar para a zona fortificada, nem que se empenhassem com tropas muito superiores. Mas as coisas não correram bem para os alemães: primeiro, foi a desobediência do comandante do I CE, general François; depois de alguns ataques bem-sucedidos pelos alemães, mais pela intrepidez do desobediente François, em que a 28ª divisão russa teve 60% de baixas, a Batalha de Gumbinnen, no seu todo, foi uma vitória russa.

A 22 de agosto, Prittwitz diz a Moltke, o Jovem, que teria de abrir mão da Prússia e retirar para o rio Vístula. Foi demitido e é substituído por um general na reforma, Paul von Hindenburg, tendo como seu chefe do Estado-Maior, Erich Ludendorff, que deu mostras de «panache» em Liège. Ludendorff, apesar de muito competente, os elogios subiam-lhe facilmente à cabeça, perdendo muitas vezes o sentido das proporções; mas estava ali Hindenburg para, como muitas vezes dizia, por o «pé no travão», pois não servia para mais nada, para além de uma simples «figura decorativa», embora a história viesse a provar que não era mesmo assim, quanto a este radical conservador, futuro presidente da República de Weimar.

Com esta nova dupla alemã, as coisas não iriam correr tanto de feição para os russos.

A 24 de agosto, os alemães preparam uma armadilha aos exércitos russos. E, a 28 do mesmo mês, os russos rendem-se aos magotes. Além do elevado número de mortos, pensa-se em 32 000, caíram em poder dos alemães 92 000 foram apreendidos 500 canhões. Foi uma enorme derrocada, a mais espetacular da guerra, tornando-se lendária a aldeia que deu nome à batalha - Tannenberg. O general do exército russo - Samsonov - suicidou-se. A Batalha de Tannenberg tornou-se um motivo de orgulho alemão. E Hindenburg-Ludendorff daí obtiveram uma reputação que perdurou muito mais tempo para além da guerra.

Mapa 14.jpg

 

A 7 de setembro, o 8º exército lança um ataque, dando-se início à Batalha dos Lagos da Masúria. Apesar dos esforços para cercar as tropas de Rennenkampf, este conseguiu, habilmente, levar as suas unidades a barrar eixos da manobra alrmã e conduzir, com êxito, um combate em retirada. A 25 do mesmo mês, o exército russo retomou a ofensiva, fazendo recuar o 8º exército alemão para a Prússia, recuperando grande parte do terreno cedido em agosto.

 

b).- Galícia e Polónia

 

Mas os russos com os austro-húngaros saíram-se bem, no sul da Polónia e na Ucrânia Ocidental.

Enquanto o 10º exército permaneceu empenhado contra o 8º alemão, por essa altura, ao 1º exército era atribuída a frente sul da Polónia e Galícia. Até ao final de 1914, o 10 exército manteria a posse da faixa de território prussiano recuperado em setembro.

Apesar da vontade do nosso já célebre Conrad (Franz Conrad von Hötzendorf) se atirar contra a Sérvia, Viena sabia que o combate principal que teria de enfrentar era com a Rússia. Como aspiravam a uma rápida vitória, o planeamento das operações, nos dois estados-maiores fez-se em termos ofensivos. No início ainda surtiu algum efeito, principalmente com a sua ala esquerda, todavia a operação na Galícia e Polónia foi um desastre. Da parte do exército austro-húngaro, houve 130 000 baixas, entre mortos e feridos, e cerca de 300 000 prisioneiros deixados nas mãos dos russos. Franz Conrad von Hötzendorf não teve outro remédio senão ordenar a retirada para as encostas setentrionais dos Cárpatos. E Berlim via o comportamento do exército austro-húngaro com alguma preocupação.

Com Falkenhayn já como comandante das tropas Alemãs, substituindo, Moltke, o Jovem, face ao fracasso a Ocidente, constituiu um novo exército - o 9º -, com Hindenburg e Ludendorff à sua frente - para colmatar a brecha criada entre o 8º exército e a linha defensiva austro-húngara. Os efetivos a leste, nesta altura, não eram nada inferiores aos do Ocidente. E o teatro de operações quer na Polónia quer na Prússia Oriental oferecia, comparativamente, muito mais espaço do que o existente em França. Nestes termos o conflito ia prosseguir segundo os princípios da guerra de movimento.

Os alemães, depois de conversações com os austro-húngaros, decidiram que o 9º exército, logo que pronto, atacaria na direção de Varsóvia, o que era uma opção arriscada. Mas os sucessos de agosto não metiam medo.

 

c).- Cárpatos

 

Os russos, por seu lado, reforçavam as suas tropas. E os serviços de informações alemães não estavam ao par disto. Desta feita, o alto-comando russo, liderado pelo grão-duque Nicolau, dispunha, agora, de um volume de forças totalizando - só na frente compreendida entre Varsóvia e Przemysl - 55 divisões de infantaria, a que se opunham apenas 13 alemãs e 31 austro-húngaras. O grão -duque Nicolau sentindo que no flanco dos Cárpatos o exército austro-húngaro lhe parecia incapaz de constituir uma ameaça, planeou uma resposta do seguinte modo: num primeiro tempo, o 4º e 9º exército iriam de Varsóvia aos encontro das tropas alemãs, procurando travá-las; num segundo momento, o 1º, 2º e 5º exército, num rápido movimento de envolvimento, atacariam, a varrer, os flancos do 9º exército alemão.

Havia de ambos os lados intenção de travar uma batalha ofensiva.

A 28 de setembro, os germânicos iniciavam a sua ofensiva, progredindo para oeste do rio Vístula, não encontrando qualquer obstáculo de monta. A 5 de outubro, a generalidade das unidades alemãs aproxima-se das margens do Vístula, dando conta que, do outro lado do rio, lhe espera um forte dispositivo russo. E retêm-se até que a ofensiva austro-húngara lograsse vencer a oposição russa. Os austro-húngaros não estavam de modo a poderem prestar aos alemães o apoio tática que se lhes exigia. E os russos acabam mesmo por passar para a margem esquerda do Vístula. Perante tal manobra, o comando do 9º exército, não tendo ilusões quanto ao insucesso da operação ofensiva, retiraram-se, destruindo a rede ferroviária à retaguarda, numa profundidade de 150 Km, de modo a não ser utilizada pelos russos.

A Batalha de Varsóvia (ou batalha do rio Vístula), embora tenha sido uma irrefutável vitória do exército russo, não viu concretizada a 2ª fase do seu plano de operações, que apontava para o aniquilamento do inimigo através de um ataque ao seu flanco sul. A prudente retirada alemã inviabilizou a operação.

A 20 de novembro, no setor dos Cárpatos, o general Busilov, comandante do 8º exército russo, conseguiu conquistar a garganta de Lupkow, abrindo uma passagem que lhe permitia descer para a grande planície húngara e marchar sobre Budapeste. As hesitações dos russos permitiram aos austro-húngaros explorar a debilidade do dispositivo inimigo, permitindo a recuperação da garganta de Lupkow e com posições firmes na encosta setentrional dos Cárpatos.

Estava determinado o padrão da guerra: a oeste, um impasse; a este, uma crise austro-húngara, mais ou menos permanente.

Quer na frente leste, quer na frente oeste, ficou claro que as tropas que atacassem frontalmente, seriam recebidas por uma saraivada de projéteis de artilharia e de armas de infantaria, a partir de posições escavadas no terreno, com as quais os canhões não podiam lidar facilmente, mas que em ofensivas ou contra-ataques podiam causar muita mossa.

Ao terminar o ano de 1914, os números da guerra já eram arrepiantes. Um excelente jornalista russo, chamado Leon Trostsky, escrevia nessa altura ”«agora vem uma guerra e mostra-nos que ainda caminhamos sobre quatro patas sem sair do estado bárbaro da nossa história. Aprendemos a usar os suspensórios, a escrever editoriais inteligentes e a fabricar chocolate com leite, mas quando temos de decidir seriamente uma questão relativa à coexistência de umas quantas tribos numa rica península da Europa, sentimo-nos impotentes para encontrar outra via que não seja uma mútua carnificina generalizada»” (Canal da História, 2013: 108).

02
Jun15

Poesia e Fotografia 102

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

ANUNCIAÇÃO

  

Luz da manhã que vens do mar salgado

E és a vela do sonho que viaja,

Quebra a vidraça deste olhar cansado!

Que o poeta reaja!

 

Costa Nova, 18 de Agosto de 1944

08606_HD.jpg

01
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 39

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

3.5.- O Armistício

 

A 5 de outubro, um novo impulso Aliado, fez recuar, em desordem, as unidades alemãs para as derradeiras posições antes do armistício. Animicamente destroçados, os soldados alemães, renderam-se aos milhares.

As populações belgas e francesas regressaram aos seus territórios ocupados, aclamando entusiasticamente os exércitos libertadores.

A situação interna na Alemanha estava a deteriorar-se rapidamente. No dia 28 de outubro de 1918, os marinheiros da base naval de Kiel sublevaram-se perante o receio de que os comandos da marinha de guerra quisessem utilizá-los numa operação suicida de afundamento dos seus navios, quando era de domínio público que a guerra não poderia ser ganha. Os marinheiros revoltosos provocam a morte de diversos oficiais. A 5 de novembro, por todo o país, formam-se conselhos de soldados e operários, enquadrados pelo partido socialista independente.

A impossibilidade de ganhar a guerra, depois da grande ofensiva de Ludendorff na primavera de 1918, leva a que a cúpula militar alemã, detentora de todo o poder durante a guerra, tivesse de ceder terreno.

A Alemanha foi a última das Potências Centrais a solicitar o fim das hostilidades aos Aliados. De entre as razões que se apontam para tal gesto foi a queda a pique do moral das suas tropas; o pleno esgotamento da sua população civil; o esgotamento dos recursos económicos para continuar a beligerância; o perigo da invasão do seu território pelas tropas Aliadas; o perigo e/ou receio do deflagrar de uma revolução social, a exemplo da Rússia. A Alemanha caiu pelo esgotamento, não por que o seu exército tivesse sido derrotado pelo inimigo numa ação militar decisiva ou definitiva, pese embora a sua contínua retirada, principalmente na Frente Ocidental.

O presidente norte-americano Woodrow Wilson recusa-se a negociar o cessar das hostilidades enquanto não estivessem realizadas as reformas políticas necessárias e elementares para democratizar o país.

A 9 de novembro, face à gravidade da situação, o kaiser aceita renunciar ao trono da Alemanha e da Prússia, para si e seus herdeiros, e exila-se na Holanda. Toda a realeza do império alemão renuncia.

No mesmo dia, a 9 de novembro, o chanceler Max de Baden transferiu os seus poderes para o líder socialista Friedrich Ebert. Enquanto, em Berlim, Scheidemann, ministro social-democrata, proclama a República nas escadarias do Reichtag, o ministro do Negócios Estrangeiros, Erzberg, desde 7 de novembro, na floresta de Champiègne, em Rethondes, negoceia com o marechal Foch e o almirante britânico Rosslyn Weymss, os termos da capitulação alemã.

versailles02.jpg

O armistício aceitava os Catorze Pontos de Woodrow Wilson, assim descriminados:

01.- Abolição da diplomacia secreta;

02.- Liberdade dos mares;

03.- Eliminação das barreiras económicas entre as nações;

04.- Redução dos armamentos nacionais;

05.- Redefinição da política colonialista, levando em consideração o interesse dos povos colonizados;

06.- Retirada dos exércitos de ocupação da Rússia;

07.- Restauração da independência da Bélgica;

08.- Restituição da Alsácia-Lorena à França;

09.- Reformulação das fronteiras italianas;

10.- Reconhecimento do direito ao desenvolvimento autônomo dos povos da Áustria-Hungria;

11- Restauração da Romênia, da Sérvia e de Montenegro e direito de acesso ao mar para a Sérvia;

12.- Reconhecimento do direito ao desenvolvimento autônomo do povo da Turquia e abertura permanente dos estreitos que ligam o Mar Negro ao Mediterrâneo;

13.- Independência da Polônia;

14.- Criação da Liga das Nações, ou Sociedade das nações.

Para além destes pontos, um dos aspetos imediatos do armistício, aceite pelos alemães, em 11 de novembro de 1918, foram:

  • Repatriamento de todos os prisioneiros;
  • Evacuação dos territórios invadidos, incluindo os que os alemães ocuparam a leste, após Brest-Litovk;
  • Evacuação da margem esquerda do Reno pelos exércitos alemães;
  • Proibição de destruir caminhos-de-ferro e estradas;
  • Reparação das regiões devastadas, como minas, condutas de água, etc.;
  • Restituição dos objetos roubados durante a guerra;
  • Direito de requisição em terreno ocupado;
  • Entrega de 500 canhões e 25 000/30 000 metralhadoras, 5 000 peças de artilharia e três mil morteiros de trincheira;
  • 1 700 aviões;
  • 10 couraçados;
  • 6 cruzadores de combate (Grosser Kreuzer);
  • 8 cruzadores ligeiros;
  • 50 contratorpedeiros;
  • Rendição de todos os submarinos alemães;
  • Restituição de 5 000 locomotivas e 15 000 vagões;
  • Etc..

Pela discussão à volta do conteúdo do armistício, estas últimas cláusulas eram mais ditadas pela vontade dos franceses que dos britânicos e americanos, vistas à luz das primeiras propostas de Wilson. Mas Ferro (2008) diz que, de certa forma, até eram benignas, se tivermos em conta as devastações causadas nos territórios franceses e belgas bem assim as suas perdas humanas, bem mais pesadas do que entre os dois Aliados. Se bem que a questão das indemnizações de guerra seria uma questão a tratar posteriormente, ficou, contudo, aqui bem patente as diferenças de posições que mais tarde as duas delegações iriam patentear aquando da discussão à volta do Tratado de Paz de Versalhes: ou seja, nem americanos nem ingleses desejavam uma “paz de castigo que pudesse ressuscitar o espírito de desforra” (Ferro, 2008: 275).

E alguns autores opinam e interrogam-se como, na altura, nomeadamente Poincaré, não se apercebeu da vantagem necessária de o inimigo se sentir mesmo derrotado, levando a guerra até ao seu próprio território e mesmo, em 11 de novembro, não tiveram sequer a ideia de destruir o seu potencial industrial ou de controlar a sua economia. Diz Marc Ferro: “Estes militares concluíram «um armistício entre soldados». A Europa e a guerra tinham entrado na era industrial, eles continuavam a ignorá-lo e, quais cavaleiros medievais em pleno século XX, julgavam que uma nação desarmada era uma nação vencida” (2008: 275). E continua o autor: Assinado o armistício, os vencedores descobriram, sob a capa de um povo submisso, uma nação encolerizada. Desde 1914 que os Alemães tinham conseguido manter inviolado a Vaterland, ocupando ainda três quatros da Bélgica, Mézières e Rriey no dia do armistício. Durante mais de quatro anos, as tropas imperiais tinham acampado em território inimigo e destruído as suas forças vivas. Haviam perdido uma batalha mas, exceto em alguns setores da retaguarda ou da frente, nem os civis nem os militares tinham o sentimento de ter perdido a guerra”.

Era este também o «estado de alma» de um Aliado: em Berna, Sir Horace Rumbold, que tinha estado em serviço na embaixada em Berlim em 1914, também estava preocupado por os alemães fazerem a paz demasiado cedo. “«Seria lastimoso», escreveu ao ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, a 14 de outubro de 1918, «se parássemos antes de os esmagarmos por completo na Frente Ocidental. Devemos persegui-los no seu maldito país pois será a única forma de eles e a sua população saberem o que significa a guerra»” (Gilbert, 2007: 704).

O historiador britânico Hew Strachan também tem a mesma visão quando diz: “«Quando depôs as armas [a Alemanha] ainda ocupava profundas posições no território inimigo em todas as frentes, não se tinha penetrado na sua frente nem se tinha conseguido cercá-la, portanto, não se manifestou nenhuma das características que uma derrota operativa no campo de batalha compreende»” (citado pelo Canal da História, 2013: 358). Por outro lado, não se sentindo totalmente vencidos, a propaganda de guerra e a vitória na frente oriental reforçavam a aura de invencibilidade daquelas tropas. Por isso, não admira que, a 11 de dezembro de 1918, as tropas alemãs que desfilaram pela avenida berlinense Unter den Linden fossem recebidas e saudadas pelo novo chanceler que lhe proferiu as seguintes palavras: Saúdo-vos, a vós que haveis regressado invictos do campo da batalha». Refere Canal da História (2013: 359) que a princesa Blücher, de origem inglesa mas casada com um aristocrata prussiano visse homens a desfilar que “«usavam coroas de louro verde sobre os capacetes de aço, todas as espingardas levavam o seu pequeno ramalhete de flores, as metralhadoras estavam enfeitadas com ramos verdes, e junto a eles havia meninos sentados agitando bandeiras de alegres cores»”.

Perante este cenário e estado de espírito, não espanta assim que o historiador alemão Hagen Schulze afirme que “«a primeira democracia alemã não nasceu da própria força dos partidos políticos e do parlamento, mas sim como última saída de um Estado-Maior desesperado [...] O mito da punhalada à traição, que deveria envenenar posteriormente a vida pública da República de Weimar, teve aqui a sua origem»” (Canal da História, 2013: 359).

Neste sentido também vai a opinião de David Martelo: “A rápida derrocada da estrutura militar germânica - sem que se tivesse registado uma estrondosa derrota numa batalha de grandes dimensões - lançou no seio da população a semente que faria germinar a tese da «punhalada nas costas», tão cara aos movimentos nacionalistas que não tardariam a agitar a Alemanha” (Afonso; Gomes, 2013: 478).

A Grande Guerra teve a duração de quatro anos e três meses. Os contendores mobilizaram no total mais de 65 milhões de homens.

A 11 de novembro, na carruagem que transportava o marechal Foch, era assinado o Armistício que punha fim, às 11 horas desse dia, à Grande Guerra.

Tinha-se descerrado o pano do 1º ato da tragédia. Ia-se para o intervalo até que começasse o 2º ato.

01
Jun15

Poesia e Fotografia 101

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

EMBALO

  

Sono ao cantar das águas, ópio leve

A quem se empresta à vida...

Brando Deus que nos compra e que nos deve

À nossa Deusa mãe adormecida.

 

Frescos, os sonhos passam

Na tela etérea e branca das espumas...

Frescas mãos de ninguém os amordaçam

E apagam nos abismos e nas brumas.

 

Um pesadelo só de vez em quando:

E se o Deus adormece?

Mas o Deus acordado vai cantando

A música imortal que nos merece...

 

Gerês, 7 de Agosto de 1944

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