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zassu

20
Mai15

Grande Guerra (1914-1918) - 28

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

2.4.2.- 1916: Coordenando a guerra. Batalhas. O aparecimento dos primeiros carros de combate. Mudanças na condução da guerra

 

2.4.2.1.- Coordenação política e militar - Conferências Interaliadas

 

Com a mudança de governos quer em França quer na Grã-Bretanha, em finais de 1915, os chefes de governo, quer em Paris quer em Londres, reconheceram a necessidade de encetarem medidas de coordenação política e militar entre todos os países Aliados.

Neste sentido, a 4 de dezembro de 1915, o chefe de governo francês, Aristide Briand, reuniu-se, em Calais, com Lloyd George, ministro liberal britânico das Munições, estando presentes Horatio H. Kitchener, ministro britânico da Guerra, Joffre e Gallieni. Esta reunião levou à realização do primeiro Conselho de Guerra Interaliado, sob a presidência de Joffre e com a presença de representantes militares da Grã-Bretanha, Rússia, Itália, Bélgica e Sérvia. Foi nesta reunião que se consertaram as atividades militares operacionais para 1916 e a estratégia ia no incremento das ações ofensivas nas três frentes principais - ocidente, oriente e italiana - e de contenção nos teatros de operações menores - Salónica, Egito e Mesopotâmia. A par desta estratégia, ficou ainda assente que as grandes ofensivas deveriam ser lançadas em simultâneo para dificultar o uso das reservas por parte do inimigo. Face às dificuldades pelas quais o exército russo estava a passar, quanto a armas, munições e equipamentos, as ofensivas a oriente, antes de junho de 1916, não poderiam ser levadas a cabo.

Era um espírito otimista no querer lançar grandes ofensivas conjuntas, face às dificuldades da indústria militar dos países Aliados na enorme produção de armas e armamentos, mas que estavam a ser ultrapassadas, ao dar-se agora prioridade, na Inglaterra, ao setor militar, em detrimento das exportações.

Daí que, no campo da produção de material militar, apesar de tudo, as perspetivas eram otimistas, outro tanto não se poderia dizer quanto ao potencial humano. A França, sobretudo, estava no limite das suas reservas de recrutamento, ao ponto de o número de unidades de combate ter sido feito com recurso à redução de efetivos na área da retaguarda. Mas a Grã-Bretanha, com um exército profissional e graças ao apelo de H. Kitchener à incorporação de voluntários, na primavera de 1916, tinha um exército constituído po 70 divisões, ou seja, dez vezes mais efetivos do que havia em agosto de 1914. Tal circunstância permitiu que a FEB, em janeiro de 1916, ocupasse uma extensão maior até aí da responsabilidade do 2º exército francês, então sob o comando do general Pétain.

Em dezembro de 1915, French, magoado pelas críticas que na Grã-Bretanha faziam ao seu comando, demite-se. Haig substitui-o e French é nomeado Comandante-Chefe das Forças Armadas Britânicas, cargo que ocupou até 1918.

A 14 de fevereiro de 1916, realiza-se outra Conferência Interaliada, em Chantilly. Aí ficou decidido que, se os alemães cedessem a iniciativa aos Aliados, estes lançariam uma poderosa ofensiva na frente do rio Somme, a 7 de julho, data que só seria antecipada caso ocorresse uma grande ofensiva na Frente Oriental.

Por sua vez, Falkenhayn, convencido que o exército russo estava completamente dominado, face às informações que tinha dos problemas internos do regime czarista e que, acreditava, estava à beira de uma revolução, achou ser altura de exercer um novo esforço principal a Ocidente. E, considerando, face à sua experiência, que os britânicos eram mais fortes a defender, Falkenhayn, e o seu OHL, planeia uma ofensiva na região de Verdun, com o nome de código Operação Julgamento. Kaiser Guilherme II estava de tal forma entusiasmado de desabafou: «Esta guerra terminará em Verdun!»

Segundo este estratega, a ação terrestre deveria ser complementada com uma guerra submarina sem restrições para, assim, ferir a superioridade marítima e industrial dos Aliados. Ou seja, abalar-lhes, decisivamente, o seu moral: em terra, os franceses; no mar, os britânicos.

Este assunto - o da guerra submarina -, entre os altos dirigentes alemães, não era muito pacífico. Falkenhayn, bem como Tirpitz, eram partidários, nesta data, da guerra submarina irrestrita; por outro lado, o chanceler Bethmann-Holweg, e o próprio kaiser, Guilherme II, temiam, ou receavam, que tal guerra levasse à rutura com os Estados Unidos - pelas perdas do comércio marítimo daquele país com a Europa - e a sua entrada no conflito ao lado dos Aliados fosse uma realidade. Nesta altura ficou adiada a guerra submarina sem restrições, com a consequente saída, por demissão, do Secretário de Estado da Marinha, almirante Tirpitz, o grande propulsor da grande esquadra alemã.

Para uma ação de envergadura a Ocidente era necessária a transferência de tropas da Frente oriental para ocidental. A dupla Hindenburg-Ludendorff, apostados e confiantes numa vitória decisiva a leste, opuseram-se. Falkenhayn teria de operar com os recursos materiais e humanos que dispunha a ocidente, sem o reforço do leste, e sem o efeito desgastante e moral da guerra submarina irrestrita que poderia provocar nos Aliados.

2.4.2.2.- Batalhas

a).- Batalha de Verdun ou «Operação Julgamento» - Fases e etapas

Falkenhayn escolheu Verdun pelo valor simbólico que o local poderia ter para o inimigo: a queda daquela fortaleza poderia levar à quebra do moral dos franceses, ao fraquejar do seu élan vitale. Por outro lado, Verdun era um saliente pronunciado na longa frente de combate e, sob o ponto de vista tático, a ofensiva oferecia o aliciante de se poder processar em duas direções - norte e este.

1ª Fase

De janeiro a fevereiro de 1916, o 5º exército alemão foi reforçado com 10 divisões e diverso material de artilharia e tinha 2,5 milhões de granadas disponíveis: era a maior concentração de poder de fogo jamais vista. O objetivo de Falkenhayn baseava-se numa tática ou ação de verdadeiro desgaste do inimigo, consumindo-o numa estreita faixa de 13 Km.

Por sua vez, do lado francês, a experiência ensinava-lhes não ter muitas ilusões quanto à capacidade das fortalezas defenderem-se por si próprias: Verdun seria defendida bem mais à frente das suas fortificações. A criação da Região Fortificada de Verdun (RFV), em agosto de 1915, tinha exatamente esse desiderato. Estendia-se desde Avoncourt até às alturas de Saint- Mihiel, com um total de 5 divisões.

Os preparativos da operação alemã não passaram desapercebidos aos franceses. Joffre, então, entregou a defesa da RFV ao firme general Pétain. Com o seu comando, a RFV, para além das 5 divisões, passou a ter mais 4 Corpos de Exército (CE).

Com esta força, Pétain não perdeu tempo e, apesar da pressão alemã, de 26 de fevereiro a 4 de março, o XX CE travou um encarniçado combate pela posse do forte de Douaumont, que ficou totalmente destruído e na posse dos alemães. Refere David Martelo que “nesse combate, foi ferido e aprisionado o capitão Charles de Gaulle, futuro Presidente da França” (Afonso; Gomes, 2013: 229).

Falhado o ataque frontal às posições da margem direita do Mosa, os alemães alargam a ofensiva para áreas da margem esquerda - mais abertos e menos acidentados. A 6 de março, o primeiro ataque a oeste de Mosa levou ao colapso da 67ª divisão. Os franceses, todavia, em contra-ataques simultâneos, repuseram a situação.

A 9 de abril, o exército alemão voltou a atacar. Falkenhayn estava apostado numa operação de puro desgaste. Mas também teria de contar com o estado das suas tropas. Em fins de maio, o número de mortos e feridos alemães, desde o início da ofensiva, a 21 de fevereiro, tinha atingido o número de 100 000. Com o decorrer dos combates, a erosão tornou-se mais sensível do que nos franceses porque estes “através da rotação das divisões em primeiro escalão, garantiram às tropas algum repouso em posições recuadas. Os alemães, pelo contrário, mantinham a mesmas divisões ao contacto e recompletavam as baixas com rendições individuais” (Afonso; Gomes, 2013: 229).

Outro impulso ofensivo levou os alemães a atacar o forte de Vaux. A guarnição foi cercada e atacada e acabou por render-se por falta de água.

A persistência e firmeza de Pétain só foi conseguida à custa de pesadas baixas. Pétain menosprezava as enormes perdas das suas tropas. Joffre, reconhecendo tal facto, nomeou-o como comandante do Grupo de Exércitos do Centro, uma promoção, e a RFV foi entregue ao general Nivelle, perito em artilharia.

A 22 de junho, o exército alemão lançou novo ataque na margem direita do Mosa, procurando conquistar os fortes de Souville e Tavannes. “Fê-lo proceder de uma preparação com gás «Cruz Verde», uma forma aperfeiçoada de gás cloro. Desta vez, porém, o objetivo principal do bombardeamento foi a linha de posições da artilharia francesa. A neutralização temporária dessas guarnições permitiu à infantaria alemã progredir em condições de superioridade tática” (Afonso; Gomes, 2013: 230).

Este avanço colocou os alemães numa situação muito próxima de Verdun. E eis que surge um apelo desesperado: “«Não passarão!», era a última linha de uma ordem de serviço do general Nivelle” (Gilbert, 2006: 387).

Para o abastecimento de material e de tropas, os franceses só podiam contar com uma estrada ameaçada pelo inimigo (que recebeu o nome de La Voie Sacré, «a via sacra») e com uma linha férrea de via única (que diariamente evacuava cadáveres e feridos, depois de trazer provisões ou reforços), “pelo que foi necessário defender a comunicação e o trafego ao milímetro para não levar os defensores de Verdun ao desastre” (Canal da História, 2013: 120).

A 30 de junho, depois de contra-ataques iniciados a 24, os franceses conseguiram suster o avanço alemão, marcando o fim da primeira fase da batalha.

Depois de quatro meses de combates, foi enorme o grau de destruição na região, nunca dantes imaginada. Quanto a perdas humanas, foram, de ambos os lados, 200 000, entre mortos e feridos.

2ª Fase

A 1 de julho, os Aliados dão início à operação programada do Somme. Os alemães, tendo uma ofensiva em grande escala numa outra área da frente, e com necessidade de lhe dar apoio, levou a que, entre 24 de outubro e 3 de novembro de 1916, os franceses reconquistassem a parcela de terreno perdido, em cunha, na qual se incluíam os fortes de Vaux e Douaumont.

A 11 de dezembro, depois de uma intensa preparação de artilharia, os franceses dão início a uma nova ofensiva, levando a que, a 18, repusessem as linhas que tinham a 25 de fevereiro.

Nesta semana, a derrota do exército alemão contabilizou-se em 12 000 prisioneiros e 284 bocas-de-fogo de artilharia.

Para Falkenhayn, a Operação Julgamento, sob o ponto de vista ofensivo, redundou num enorme fracasso. A partir daqui, os alemães abandonarem o claro pendor ofensivo.

Mapa 4.jpg

b).- Batalha do Somme

Esta operação foi preparada pelos Aliados com o maior rigor no saliente do Somme, em julho.

A FEB deveria entrar com 20 divisões do recém-formado 4º exército, comandado pelo general Rawlinson; os franceses, face ao seu empenhamento em Verdun, entrariam com 3 divisões.

A artilharia era composta por 1 180 peças e 245 obuses pesados, possibilitando uma densidade de fogo elevadíssima nos 15 Km escassos de frente de ataque.

O general Haig, diz David Martelo, “estava persuadido de que os fogos que precederiam o ataque seriam suficientes para destruir as barreiras de arame farpado e transformar as linhas alemãs num amontoado de ruinas [E continua]. Emendando erros ofensivos, as tropas britânicas teriam as reservas muito próximo das unidades em primeiro escalão, de modo a poderem reforçar oportunamente o ataque. Diante da infantaria a artilharia colocaria barragens de fogo rolantes, de modo a suprimir as defesas” (Afonso; Gomes, 2013: 231-232). Só que, e como adianta David Martelo, “executar barragens rolantes sem meios de rádio - então inexistentes - era, todavia, uma técnica arriscada, que só poderia ser feita a horário ou utilizando a problemática modalidade de sinais pirotécnicos” (Afonso; Gomes, 2013: 232). Saídas as tropas ofensivas das trincheiras, o fluxo de informações de campanha para os escalões superiores é quebrado. E os comandantes, sem dados atualizados sobre os combates, não têm qualquer possibilidade de influir na condução do ataque, nomeadamente na prioridade dos fogos e no controlo dos movimentos. Nestas circunstâncias, e como bem diz David Martelo (in: op.cit.: 232), os generais são “taticamente, cegos, surdos e mudos”.

Pelo lado dos alemães, “a engenharia militar construíra a mais completa e sofisticada linha de defesa de toda a frente. O terreno, seco e calcário, favoreceu a construção e conservação de todo o tipo de estruturas enterradas e vias de comunicação” (Afonso; Gomes, 2013: 231).

Quando, a 1 de julho de 1916, a infantaria se lança ao ataque, saindo das trincheiras, deu-se imediatamente conta: primeiro, que o efeito das granadas de artilharia não surtiu qualquer efeito na destruição das redes de arame farpado; segundo, o efeito de destruição das posições inimigas protegidas foi quase nulo; terceiro, quando mal os atacantes ficaram ao alcance das armas alemãs, começou um verdadeiro massacre, constituindo esse dia a data mais negra da história do exército britânico. Os cerca de 100 000 que invadiram a terra-de-ninguém, foram mortos 20 000 e feridos 40 000, ao passo que as baixas alemãs não foram mais que 3 000, entre mortos e feridos.

A mortandade foi impressionantemente chocante, mesmo até para os próprios alemães!

Apesar destas terríveis perdas, os Aliados voltaram, nos dias seguintes, ao ataque.

Nesta batalha, o máximo de progressão conseguida não ultrapassou, em momento algum, os 12 Km. Uma frustração, face aos meios empregues e às enormes vítimas!

Mapa 5.jpg

A grande lição a tirar desta batalha é que não foi por falta de coragem dos soldados que os ganhos tinham sido tão diminutos e as perdas tão volumosas, o que sucedia é que a infantaria que defendia, protegida por trincheiras e abrigos, possuía uma enorme vantagem sobre o inimigo atacante, a descoberto e, ainda por cima, com obstáculos pelo meio.

Quando a 19 de novembro de 1916, a ofensiva foi dada como concluída, o role das vítimas foi o seguinte, em termos de baixas: alemães - 600 000, entre mortos e feridos; britânicos - 419 654; franceses - 194 451. Um horror!

20
Mai15

Poesia e Fotografia 91

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

ORDEM

Este relógio de sala

Que marca as horas passadas

Aqui ao lado,

Fala

Como um deus aos seus fiéis.

De silêncios abismais,

Coberto de majestade,

Sem dizer com que verdade,

Bate as seis.

 

E o que é certo é que desperta

A vida na sua cama!

O que é certo é que me chama

Para que não sei que rigor

De infindável penitência.

E me faz

Mais algum tempo capaz

De suor e paciência.

 

Coimbra, 8 de Abril de 1944

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19
Mai15

Grande Guerra (1914-1918) - 27

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

 

2.4.1.2.- As batalhas de 1915

 

Vistas no mapa, “as linhas alemãs pareciam muito vulneráveis porque se projetavam numa grande saliência, com Noyon no vértice, a 75 Km de Paris, e os jornais franceses saiam todos os dias com esta notícia em primeira página” (Stone, 2011: 83) a lembrar o perigo. Por outro lado, os generais, à procura de publicidade favorável, ficaram completamente hipnotizados: um novo ataque garantia a libertação do território nacional. Por outro lado ainda, os soldados-voluntários de Horatio Herbert Kitchener, aos milhões, trocaram a monotonia da vida das cidades industriais pelo suposto fascínio da vida de soldado e estavam dispostos a avançar. Finalmente, as saliências eram vulneráveis a ataques laterais: a de Artois, na orla norte, onde a FEB estava implantada e ganhava força, e a de Campagne, por conta dos franceses, a nordeste de Paris, na orla sul.

a).- Neuve-Chapelle

Os britânicos, querendo mostrar aos franceses a sua reputação de bons combatentes, em 10 de março de 1915, lançam uma ofensiva, com quatro divisões, no setor de Neuve-Chapelle. O ataque, iniciado com um ímpeto notável, apanhou os alemães, que guarneciam as primeiras linhas das trincheiras, de surpresa. Em 20 minutos, penetraram no terreno defendido pelos alemães, 1 500 metros. Mas as dificuldades de comunicação com os escalões superiores retardaram o prosseguimento da ofensiva, permitindo aos alemães contra-atacarem com as suas reservas, “entre as quais a 6ª Divisão Bávara de Reserva, onde Adolf Hitler prestava serviço como estafeta de um batalhão” (David Martelo, in: Afonso; Gomes, 2013: 220-221), anulando o êxito inicial. Três dias de combate e a conquista de escassas centenas de metros de terreno, em Neuve-Chapelle, resultou em 11 652 baixas, para a FEB, e 8. 600, para os alemães.

b).- 2ª Batalha de Ypres - os gases

Em abril de 1915, em Langemarck, a poucos quilómetros de Ypres, os alemães tinham 6 000 munições carregadas com gás cloro. As tropas Aliadas eram, neste local, guarnecidas por duas divisões francesas - a 45ª argelina e a 87ª Territorial. Às 17 horas do dia 22 de abril, depois de um intenso bombardeamento alemão, “uma nuvem cinzento-esverdeada, soprada por uma brisa este-oeste, começou a mover-se para as trincheiras francesas. Atingidos pelo gás, milhares de soldados norte-africanos, de mãos nas gargantas, tossindo, cambaleando e com as faces azuladas, abandonaram as posições e afastaram-se, desesperadamente, para a retaguarda, deixando desguarnecidos 8 Km da frente. O ataque da infantaria alemã, que se seguiu, não soube explorar convenientemente a rutura da frente, permitindo a reorganização do setor com recursos a reservas” (David Martelo, in: Afonso; Gomes, 2013: 222). Foi a primeira vez que, na Frente Ocidental, foi utilizado o gás cloro.

Mapa 3.jpg

E continua o mesmo autor: “As baixas provocadas pelo gás foram substanciais, variando desde os que tiveram morte quase imediata, aos que morreram nas 12 horas seguintes e aos que ficaram afetados para o resto da vida. Identificado o tipo de gás, a primeira contramedida adotada foi a utilização de trapos humedecidos para a proteção das vias respiratórias uma vez que o cloro é solúvel na água [...] A rápida adoção das máscaras antigás fez com que a utilização do gás venenoso jamais tivesse obtido os êxitos táticos que se haviam imaginado. O seu emprego estava, de resto, dependente de condições meteorológicas favoráveis, nomeadamente da existência de vento com direção e intensidade adequados ao desenvolvimento da nuvem de gás” (in: op. cit: 224-225).

c).- Ofensiva em Artois

Em maio, os Aliados lançaram uma nova ofensiva em Artois. Tendo o 1º exército britânico, partindo de Neuve Chapelle, na direção das cristas de Aubens, ficado bloqueado. O XXII Corpo de Exército (CE) francês, do general Philippe Pétain, galgando os cumes de Vumy, avistando a planície de Douai, desejava privar os alemães de parte da via-férrea Lille-Metz, conquistando este território. O que se passou resultou, contudo, num insucesso para os franceses: enquanto os alemães reuniram rapidamente reservas para contra-atacar, as unidades de Pétain, necessárias para consolidar posições conquistadas, encontravam-se a cerca de 9 Km. O resultado, naturalmente, foi a recuperação das posições, anteriormente perdidas, pelos alemães.

d).- Nova ofensiva em Artois e em Champagne

Apenas a 25 de setembro é que os Aliados desencadearam outra grande ofensiva, simultaneamente em Artois e Champagne. O inimigo, apercebendo-se dos preparativos, e munidos da experiência de quase um ano de trincheiras, utilizam o fogo defensivo nesta seguinte lógica mortífera:

  • Fogo de artilharia contra as zonas de reunião e as bases de ataque das unidades inimigas;
  • Barragens de artilharia sobre a terra-de-ninguém, logo que as unidades atacantes iniciavam o avanço para os objetivos;
  • Fogos de metralhadora, a curtas distâncias, sobre os elementos que tivessem sobrevivido às duas fases anteriores.

O ataque de Artois, iniciado em dezembro de 1914; a batalha de Champagne, iniciada a 20 de dezembro de 1914, e prolongada até 17 de março de 1915, cifrando-se em 90 000 baixas, do lado francês, e 50. 000, do lado alemão, vieram demonstrar que as operações ofensivas queridas por Joffre subestimavam o obstáculo criado pela organização do terreno - trincheiras -, criada pelos alemães, resultando numa custosa desilusão e sem quaisquer ganhos significativos de terreno.

A ofensiva de Artois e de Champagne, que durou até ao final de outubro, durante cinco semanas de combate, não conseguiu, pela parte dos Aliados, uma única penetração na segunda linha alemã e sofreu 200 000 baixas, entre mortos, feridos e prisioneiros: uma evidente carnificina; porém, insuficiente para impedir os altos comandos militares de repensarem de outra forma o executarem as operações. O padrão, infortunadamente, para as tropas de ambos os campos de batalha, permanecia imutável até ao final do conflito.

Em suma, os mesmos erros de sempre: “a infantaria voltou a avançar a descoberto, em ondas de milhares de homens, sendo dizimada de forma inglória pelos atónitos atiradores germânicos” (Afonso; Gomes, 2013: 225).

Não se resiste em deixar aqui expressa uma nota de humor negro, referida por David Martelo: “Nesse outono [de 1915] o major John Stewart, do 9º regimento Black Watch, como se estivesse a participar num grande evento desportivo, escrevia para a mulher: «O mais importante de tudo é matar o máximo de hunos [alemães] com o mínimo de perdas da nossa parte; é uma grande partida que os nossos aliados estão a jogar em ótimo estilo»” (Afonso; Gomes, 2013: 225).

E lembrar aqui uma das obras clássicas da guerra - Goodbye to All That - de Robert Graves, repositório das suas memórias e da visão que, quanto a este período e a estas batalhas, o autor nos apresenta.

Face a esta situação de completo impasse que a guerra das trincheiras, perante adversários com o mesmo ímpeto, em termos de vontade e força moral e material, foram sintomáticas e reveladoras as palavras de Foch, referidas por David Martelo: “Não era possível conquistar organizações que os meios modernos tinham permitido instalar só à força de homens; era preciso exigir à indústria, o mais cedo possível, material para os aniquilar. As preocupações do comando deveriam transferir-se para a capacidade de produção. Eram essas as únicas possibilidades de fazer sair a guerra do ponto morto em que estava, na frente oeste, pelo menos” (Afonso; Gomes, 2013: 221). Palavras sábias, finalmente! Mas que, infelizmente, de pouco serviram. No mesmo passo, David Martelo diz: “A indústria só poderia resolver o impasse desde que lograsse produzir uma arma que conjugasse o poder de fogo e a mobilidade com uma proteção eficaz [três dos elementos essenciais do combate (itálico nosso)]. Essa arma - o carro de combate (ou tanque) - estava em preparação e faria o seu aparecimento nos camps de batalha do Somme em 1916”. A oportunidade da observação de Foch levou a que, por lado dos Aliados, o esforço fosse no sentido da produção de tanques ou carros de combate. Quem toma a dianteira são os britânicos com a produção dos primeiros - os Mark I.

A preocupação, do lado alemão, no encontrar alternativas para romper as defesas fortificadas que as trincheiras representavam, através do aumento do poder de choque, foi no sentido de encontrarem um meio ou processo de destruição maciça perante o qual as trincheiras não tivessem proteção adequada. A solução encontrada foi virarem-se para a indústria química, criando agentes letais - os gases -, apesar de sua utilização ser proibida pela Conferência de Haia, de 1899. O não terem investido nos carros de combate mostrou-se, na fase final do conflito, verdadeiramente desastroso.

19
Mai15

Poesia e Fotografia 90

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

CANÇÃO

 

Mar morto da minha vida

Com ondas baixas, humanas;

Eira de palha batida,

Já sem grão nem praganas...

 

Aquece-o, triste, sem brasas,

O frio sol de Janeiro;

E andam gaivotas sem asas

A boiar no atoleiro.

 

Nazaré, 2 de Janeiro de 1944

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17
Mai15

Grande Guerra - 26

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

2.4.- O desenrolar do conflito

 

2.4.1.- 1915: O impasse. «A oeste nada de novo»

 

2.4.1.1.- Pensando no futuro da guerra

                                  

Com tropas cansadas e com o esgotamento de material bélico, havia que parar para pensar no jeito futuro a dar à guerra.

Por parte dos alemães, havia uma prudente contenção defensiva. Por parte dos Aliados, havia uma atitude mais ofensiva, com a determinação, mais por parte dos franceses, de expulsar os alemães dos territórios ocupados no norte do país. Assim, para além desta postura, mais de ordem moral, havia a acrescentar a rápida conquista dos departamentos mais ricos sobre o ponto de vista mineiro e industrial, importantes para o esforço de guerra.

Analisados os setores da Frente, Joffre, e o seu Grande Quartel-General (GQG), estudavam as áreas onde mais vantagem teriam para conseguir penetrar o dispositivo alemão, com nítida superioridade de meios, em troços de frente estreita, economizando forças nos locais menos propícios a ações ofensivas, ou seja, o terreno é que ditaria a escolha dos respetivos setores. Na zona alagadiça da Flandres e as regiões do Mosa e dos Vosges, a atitude, aqui, deveria ser mais passiva ou defensiva; nas zonas enquadradas pelo saliente da frente alemã - Arras, Somme e Champagne - deveria predominar a ofensiva.

Seguindo esta estratégia, instalou o Grande Quartel-general em Chantilly, nas margens do Oise e, a 8 de Dezembro de 1914, emitiu uma Instrução Geral - a nº 8 -, que começava assim: “A reorganização das unidades e o reabastecimento da artilharia estão em vias de se completar. Por outro lado, há numerosas indicações de que os alemães começaram a deslocar parte das suas forças para a Polónia. Chegou o momento de retomar a ofensiva para repelir o inimigo para nordeste e preparar uma outra ação sobre as suas comunicações” (Afonso; Gomes, 2013: 218).

Era, manifestamente, uma visão excessivamente otimista, tendo em conta o estado de preparação das forças francesas. E tal visão só poderia ser justificável para aliviar a pressão sobre o exército russo.

Como era timbre de Joffre, as suas ações, e consequente informação do estado ou execução das mesmas, pouca informação e conhecimento dava aos principais responsáveis políticos.

Era esta, no início de 1915, a posição dos Aliados, principalmente dos franceses.

Quanto aos alemães, Falkenhayn era mais calculista que Moltke, o Jovem, e ”tinha a noção - talvez seguindo a célebre frase de Goethe: «o génio sabe quando parar» - de que enfrentar três grandes potências estava para além das forças da Alemanha. E disse ao kaiser que não perder a guerra seria uma vitória” (Stone, 2011: 81). Apostava em convencer a Rússia a abandonar o conflito, retomando a parceria com a Prússia que imperara durante grande parte do século XIX. Era um bismarckiano, na verdade. Que não queria, tal como Bismarck, «amarrar a bela fragata prussiana ao velho e carcomido galeão austríaco». Falkenhayn não gostava muito dos austro-húngaros e as suas relações com o Conrad eram relativamente frias, mesmo desconfiadas. Nesta sua desconfiança para com Conrad, chegou-lhe a encobrir decisões que afetavam sobremaneira a Áustria-Hungria, só lhas dando a conhecer poucos dias antes das respetivas operações. A sua desconfiança era tal que incumbiu o seu oficial de ligação de descobrir secretamente a capacidade ferroviária existente a norte da Cracóvia, a fim de desencadear uma ofensiva da qual só deu notícia ao seu aliado com uma semana de antecedência. Mas a desconfiança era mútua.

A aproximação de Falkenhayn à Rússia, depois de este saber que os Aliados tinham oferecido Constantinopla ao czar Nicolau II - o que ele não podia fazer - deixou de ter sentido, tanto mais que estava em curso uma campanha agressiva contra o elemento germânico na Rússia.

Sendo assim, acabou por assumir a opção a leste, não abandonando embora a Frente Ocidental, apesar de saber, tal como Churchill, que o Ocidente só oferecia um impasse. Só que - tal decisão - ao não assumir claramente a prioridade a Oriente, teve, de imediato, uma forte reação dos dois principais responsáveis daquela frente - Hindenburg e Ludendorff. Pese embora a opção tomada por Falkenhayn, este não pode deixar de transferir da França para a Prússia algumas unidades destinadas a enfrentar a crescente pressão do exército russo. Vê-se, pois, que nesta nova (re) organização estratégica das forças alemãs, era natural que, no terreno, a sua postura fosse de pausa, e essencialmente defensiva, no Ocidente.

Entretanto, a Força Expedicionária Britânica (FEB), responsável pelo setor da Flandres também reorganizou-se melhor. Tendo sofrido um número elevado de baixas, em especial nas últimas semanas de 1914, teve necessidade não só de suprir como de reforçar a força. Nos termos desta nova reorganização, a FEB passou ao escalão Grupo de Exércitos, comandado pelo marechal French e com o seu Quartel-General em Saint-Omer. French tinha sob seu comando dois exércitos e dois grupos de cavalaria, conforme quadro abaixo mostra:

Quadro 3.jpg

Nesta nova reorganização, a FEB continuava com uma postura independente, tal como inicialmente, em relação ao GQG francês. E a cooperação e coordenação entre estas duas grandes forças continuou a processar-se, como diz David Martelo, com algumas dificuldades.

Da análise do quadro acima reproduzido, a FEB começou a integrar, no teatro de operações, novas unidades provenientes do império britânico.

Em contrapartida, os alemães já estavam a começar a estar no limite do seu recrutamento. A solução que encontraram, dado agora o novo dispositivo de guerra no terreno - as trincheiras - que requeria tropas muito menos concentradas na frente, foi aumentar o número de divisões, mediante a redução dos efetivos de infantaria de cada uma delas, ao mesmo tempo que passou a ter uma quantidade superior de artilharia e de metralhadoras, acrescentando um poder de fogo muito maior às novas divisões.

No final de 1914 e inícios de 1915, pelas circunstâncias do desaire no Marne, este foi um período de tempo mais para reflexão. Os alemães viram-se constrangidos a terem de enfrentar um tipo de guerra para a qual não se haviam preparado (estudado e treinado) convenientemente. Por tal facto, não raro era ver referido nos seus comunicados «não haver nada de novo na frente ocidental». Mas, com a sua capacidade extraordinária de organização, adaptando-se às novas circunstâncias, rapidamente obtêm uma significativa superioridade defensiva sobre as ações ofensivas Aliadas, ao retificarem os seus dispositivos defensivos da concentração das forças em primeira linha, duramente castigadas pela artilharia inimiga, para uma defesa em profundidade, mais flexível e provocando menos baixas.

17
Mai15

Poesia e Fotografia 89

 

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

NOITE

 

Noite, manto do nada

Onde se acolhe tudo,

Melodia parada

Nos ouvidos de um mudo.

 

Mãe do regresso, paz

Da batalha perdida;

Leiva morta onde jaz

A renúncia da vida.

 

Pecado sem perdão.

Aceno sem ternura;

Noite, o meu coração

Anda à tua procura.

 

Coimbra, 26 de Novembro de 1943

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15
Mai15

Grande Guerra (1914-1918) - 25

 

 

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

2.3.4.- Método do desmembramento do adversário

 

Na arte da guerra, o general Gambiez, referido por Ferro (2008: 135), “opõe o estilo direto ao estilo indireto. «O primeiro implica a redução das forças inimigas através da batalha que se procura e que se baseia na força da ação. O estilo indireto visa colocar o adversário em situação de inferioridade por ações preliminares que o desconjuntam moral e materialmente» ”. Exemplos de estilo direto foram as táticas já referidas: rutura; desgaste militar e diversão; exemplos de estilo indireto são os métodos de desmembramento do adversário; o asfixiamento e a desmoralização do adversário.

O método de desmembramento foi usado igualmente quer pelos Aliados quer pelas Potências Centrais. Entre outras ações, as Potências Centrais, tudo fizeram, para sublevar os alógenos da Rússia contra o estado czarista; suscitaram as guerra-santa nas possessões ultramarinas francesas, inglesas, italianas e portuguesas. Mas, por outro lado, os Aliados quiseram desmembrar o Império austro-húngaro; procuraram destruir o império otomano, estimulando a sublevação dos árabes.

Era tudo feito na defesa do direito dos povos, contudo, esta bandeira teria de ser assumida, levada a cabo e utilizada com alguma prudência e circunspeção. Na verdade, foi o que aconteceu com a tentativa, por parte da Entente da destruição do estado multinacional da Áustria-Hungria: eram muitos e variados interesses, ambições e nacionalismos em presença. E não foi por acaso que, aquando da convocação da 3ª Conferência das nacionalidades, uma iniciativa de personalidades suíças, que agiam em nome da União das Nacionalidades, o L’Éclair de Montepellier, referido por Ferro (2008: 137), expressava a sua opinião dizendo que esta arma tinha dois gumes e que, muito naturalmente, se poderia virar facilmente contra os Aliados dada a sua função tipicamente colonialista.

Mais do que uma arma de dois gumes, em certos aspetos, o uso deste método levou, no império turco, a resultados perfeitamente insólitos: a norte, a um verdadeiro massacre - o do povo arménio; a sul, à incrível proeza de um herói, idealista e solitário - T. E Lawrence - apelidado o padrinho da independência árabe.

As Potências Centrais, em especial os alemães, também viram as vantagens e os inconvenientes desta «política de defesa das nacionalidades». E tudo fizeram para dela, tanto quanto possível, tirar o maior proveito.

Contra o império russo, apoiaram os finlandeses, tendo um batalhão (Locksted) a combater, a seu lado, na Frente russa.

A 5 de outubro de 1916, proclamaram a independência da Polónia, num gesto espetacular, deixando a Entente de boca aberta; contudo, bem cedo os polacos se aperceberam dos intentos das Potencias Centrais, sabendo usar bem este efeito a seu favor, não se deixando enganar.

Outro tanto as Potências Centrais fizeram em relação à Irlanda, chegando ao ponto não só de estimular o movimento de resistência, como fez o cônsul alemão em Nova Iorque, como inclusive, de prepararem o desembarque, com armas e munições, na sua terra natal, do chefe da insurreição Sir Roger Casement. O projeto foi descoberto e, quando Sir Roger desembarcou de um submarino alemão, foi preso na costa e executado.

A Alemanha tudo fez para a dividir a Bélgica, ressuscitando o ideal nacional flamengo. Mas, em Berlim, os pangermanistas dividiram-se quanto à atitude a tomar quanto à Bélgica. Em 1916, os alemães puseram fim ao bilinguismo na correspondência oficial e, em 1917, decretaram a separação administrativa da Flandres e da Valónia, tendo esta como capital Namur. Em 1918, os belgas desencadearam uma manifestação contra a divisão. Entretanto, a questão belga, ainda em 1918, mudava completamente - a Alemanha planeava anexar completamente uma parte do país.

A par de, na Ásia, os ingleses quererem atacar Constantinopla e sublevar os árabes, por sua vez, os turcos e alemães procuraram sublevar a Índia, a Ásia Central e todo o mundo muçulmano contra os ingleses. Tinham a intenção de dominar o Irão e, depois, a partir da Pérsia, passar para o Afeganistão, de onde podiam atacar, ao mesmo tempo, a norte e a sul. Era o desencadear de uma guerra-santa que tinha como objetivo também o desmantelamento do império russo. A sul, turcos e alemães contavam igualmente sublevar as populações em nome do Islão para, assim, porem fim ao domínio inglês na Índia. O verdadeiro objetivo da Alemanha, em 1916, foi o mar Negro e o mar Cáspio, segundo Winston Churchill. Atingir as Índias era uma ideia antiga, embora ilusória. Mas facilitada pelo desaire de Galípoli.

Por outro lado, já em 1914, a canhoneira alemã Ecbatane tentara apoderar-se de Abadan e das suas refinarias; outras tentativas foram feitas à volta do Koweit; na falta da Índia, os petróleos do Golfo Pérsico exerciam uma enorme atração sobre os alemães. Mas os ingleses, como bem dizia o coronel Sykes, consideravam estes territórios sua coutada privada e acrescentava “«mas por debaixo da mais insignificante pedra ou na menor poça de lama, estava-se certo de encontrar um agente alemão»” (Ferro, 2008: 141).

Na África negra, ingleses, franceses e belgas derrotaram em algumas semanas as tropas alemãs dos Camarões e do Togo.

No sudoeste africano, os alemães encorajaram a revolta do coronel Saint-Moritz, um chefe bóer da África do Sul que via na guerra anglo-alemã a oportunidade de uma ressurreição da pátria perdida.

A «guerra das tribos brancas», como lhe chamavam os indígenas, desacreditou os colonizadores e envenenou «o sucesso dos Aliados».

Quando abordarmos o desenvolvimento das outras frentes, daremos conta, mais em pormenor, em que consistiu a operação deste método (e o fracasso em que redundou).

E Ferro conclui que “no termo de uma longa história, a guerra enfraquecia a posição das grandes potências coloniais. No Extremo-Oriente, dava oportunidade aos Japoneses de verificarem que, pela primeira vez, uma grande potência europeia, a Alemanha, era expulsa da Ásia. O mito do primado da Europa, da sua unidade, pertencia decididamente ao passado” (Ferro, 2008: 143).

 

2.3.5.- Método do asfixiamento

 

Submarino (U-Boate) alemão.jpg

Quando, em finais de 1914, e princípios de 1915, quer os Aliados, quer as Potências Centrais, se aperceberam que a guerra não seria ganha numa única batalha, que não seria curta e que as ações nos diferentes teatros de operações desembocavam em verdadeiros impasses, com demasiadas vítimas, e sem grandes certezas quanto a um verdadeiro vencedor, começavam a pensar em novas armas capazes de aniquilar o adversário.

Da história tinham já exemplos, nomeadamente, retirados das guerras napoleónicas. Havia, agora, que por em execução essa arma que os novos meios da Marinha oferecia.

Max Weber, um dos grandes sociólogos alemães mais respeitados e de enormes talentos, em 1895, numa palestra muito publicitada, aquando da sua nomeação, com pouco mais de trinta anos, para regente de uma cadeira na Universidade de Freiburg, segundo Norman Stone, disse coisas que hoje nos parece um arrazoado sem nexo, exprimindo-se nestes termos: “A Inglaterra não tem problemas sociais porque é rica; é rica porque tem um império; exporta os indesejáveis - irlandeses, proletários, etc. - porque possui diversas Austrálias onde os pode despejar; estas Austrálias garantem-lhe matérias-primas baratas e um mercado cativo; é por isso que dispõe de alimentos baratos e não tem desemprego; a Inglaterra tem um império porque possui uma grande marinha. A Alemanha também tem indesejáveis - polacos, proletários, etc. -, pelo que também deverá despejá-los em colónias; por conseguinte, ter uma marinha é uma boa ideia; a Inglaterra aceitará uma Alemanha imperialista se numa batalha a marinha alemã for suficientemente grande para provocar danos graves à marinha britânica antes de ser afundada” (Stone, 2010: 21-22). Este discurso foi muito aplaudido pela assistência.

Embora, como ainda afirma Norman Stone, Weber não fosse desprovido de moral ao ponto de, em 1914, ao ver os seus jovens alunos a serem ceifados nos campos de batalha, não fizesse coro com os seus colegas professores que aplaudiam, entusiasticamente, a causa nacional, que estava a levar a geração mais nova para um caminho letal, o certo é que foi um dos homens da sua geração que, com a sua «autorizada» palavra levou a que os responsáveis políticos e militares mais convictamente enveredassem pela construção de uma grande marinha, hipotecando nela um terço do orçamento para a defesa do estado. E, como é óbvio, este investimento funcionou como uma espécie de chantagem, junto da Grã-Bretanha, no sentido não só de esta construir mais navios do que os alemães - quase dois para um - como, depois, e como já demos conta, concluir acordos defensivos com a França e a Rússia, dando início àquilo a que, na década de 60 do século XX, como aludia Eisenhower, se começou a chamar «complexo militar-industrial», tornando a indústria da guerra um dos setores mais poderosos da economia, dando emprego a milhares, ou mesmo milhões, de pessoas.

Durante 1914, a maioria, se não a quase totalidade dos navios mercantes alemães, foram banidos de todos os mares, recolhendo aos seus portos ou ficando em portos de países neutrais. Nesta guerra não houve uma batalha naval com o mínimo de impacto. Existiram apenas pequenas escaramuças, de pouca monta. A marinha de Tirpitz e a Grand Fleet britânica, no dizer de Norman Stone, “tinham-se transformado em encosta-livros, uma em Wilhelmshaven e a outra em Scapa Flow, no extremo norte da Escócia, ambas mais ou menos imobilizadas pelas ameaças de minas e submarinos” (2010: 105). Ambos os lados gastaram quantidades enormes de dinheiro em navios que nunca fariam nada. A Batalha de Jutlândia, ainda na opinião de Norman Stone, acabou por ser uma «não batalha»: com 150 navios britânicos e 100 alemães, esta batalha durou poucas horas. Perderam-se 14 navios ingleses e 11 alemães, tendo a esquadra alemã feito uma retirada prudente. Os alemães escaparam por pouco e compreenderam que não havia maneira de eliminar a superioridade naval britânica através de combates de esquadra. Assim, a Esquadra de Alto Mar permaneceu nos portos e optou-se pela utilização dos submarinos.

A 3 de fevereiro de 1915, a Alemanha declara uma “«zona interdita» na qual os próprios navios neutros poderiam ser atacados; em resposta, os aliados declaram também o bloqueio no dia 11” (Afonso; Gomes, 2013: 133).

Os Aliados dominavam os mares: os franceses, protegiam o Mediterrâneo, principalmente o Mediterrâneo Ocidental; os britânicos, o mar do Norte. Por isso, podiam exercer com mais eficácia a arma do bloqueio naval (económico) como forma de arruinar o comércio marítimo das Potências Centrais, ao lhes obstar o abastecimento e entrada de matérias-primas fundamentais para o funcionamento das suas respetivas economias.

As Potencias Centrais, principalmente a Alemanha, nos primeiros tempos, não se preocupou em demasia com o bloqueio naval. O comércio com os estados neutrais era, só por si, suficiente para se aguentar, nos moldes em que inicialmente começou a ser executado. É, inclusive, segundo Norman Stone, o bloqueio, ao contrário de destruir a Alemanha, deu-lhe a determinação e os meios para o estabelecimento de uma economia de guerra apropriada. Srone explica alguns paradoxos: ao se impedir a Alemanha, nomeadamente, de exportar, possibilitou que a maquinaria e a mão-de-obra excedentária fosse empregue na indústria da guerra; por conseguinte, o efeito do bloqueio britânico proporcionou à Alemanha um melhor desempenho da economia de guerra em 1915, ao contrário da Inglaterra que, com muitas mais exportações, desviou a mão-de-obra especializada para o setor exportador, ao ponto de, na primavera e verão, registar uma séria carência de munições; e mais, forneceu aos dirigentes alemães um alibi ideal para a má gestão dos produtos alimentares, passando os britânicos a serem ferozmente odiados e culpabilizados por carestias que nem sequer eram da sua lavra.

É verdade que as reservas alimentares diminuíram drasticamente no inverno de 1916-1917. A culpa foi atribuída ao bloqueio, mas o grande responsável era o sistema de controlo de preços. Assim se passou com os cereais. E, quando o preço da carne também passou a ser controlado, os animais, em vez de serem vendidos, foram chacinados. Foi o que aconteceu a 9 milhões de porcos na primavera de 1915. E, diminuída a quantidade de estrume, a colheita foi mais reduzida. O inverno de 1916-1917 ficou conhecido pelo «inverno do nabo». Contudo, o cerne do problema estava nas asneiras do controlo de preços. E é sabido que, nesta altura, os camponeses prosperaram enquanto nas cidades se comiam nabos. E, como refere Martin Gilbert (Gilbert, 2007: 328), os latifundiários prussianos eram também favoráveis à continuação da guerra porquanto “estão a receber quatro a cinco vezes mais dinheiro pelos seus produtos, enquanto o trabalho é feito por prisioneiros.

Em suma, o bloqueio transformou-se num conjunto de bolas de bilhar elípticas. Só foi utilizado de forma adequada em 1918 quando os vários países neutros foram mais eficazmente controlados pelos Aliados.

Mas os alemães também tinham as suas próprias armas para utilizar: foi não só a guerra submarina como forma preventiva ou de ameaça como, depois, a «guerra submarina até às últimas consequências», em 1917. O raciocínio era simples: se os submarinos conseguissem torpedear os cargueiros, quaisquer que fossem, que abasteciam a Grã-Bretanha, a artéria oceânica seria cortada e a população britânica enfrentaria privações pelas quais os alemães passavam como foi o «inverno do nabo», ou ainda pior. É evidente que, quer no bloqueio imposto pelos Aliados, quer na guerra submarina irrestrita por parte dos alemães, todo o direito dos povos, do comércio internacional e o conceito de contrabando foi utilizado por cada beligerante à sua maneira, como o direito fosse apenas o seu.

Assim como os alemães foram encontrando um sem fim de estratagemas para fazer face ao bloqueio, da banda principalmente dos britânicos, também, finalmente, acabou por se encontrar meios de os navios não irem para o fundo do mar ao se inventar sistemas de deteção de submarinos e ao se utilizar o sistema de comboios, devidamente escoltados pelos contratorpedeiros da marinha naval.

E bem razão tinha o chanceler alemão Bethmann-Hollweg quando, cético, punha em causa o uso da guerra submarina irrestrita: é que não o preocupava apenas as perspetivas otimistas daqueles que, matematicamente, afirmavam que a Inglaterra em meio ano claudicava; preocupava-o mais a eventual entrada dos Estados Unidos no conflito ao lado dos Aliados. Como se veio a verificar. Mas que podia o chanceler fazer contra os militares e com uma propaganda eficaz, em que a população acreditava, de que o bloqueio económico britânico era a causa de estarem a comer salsichas de ratazana e os infindáveis nabos?      

 

2.3.6.- Método de desmoralização do adversário - A propaganda e contrapropaganda

 

Baio1_Léandre1915.jpg

Com a Revolução Francesa deu-se início a uma forma sistemática e coerente de propaganda, nela se fixando os grandes princípios que norteariam, até hoje, as técnicas de persuasão.

Mas é a Grande Guerra e a Revolução Soviética de 1917 que marcam o nascimento da propaganda moderna.

Tomemos as palavras de António Ventura para a definir nos seus elementos essenciais: “construção de uma ideia do inimigo estereotipada, obviamente negativa, geradora de ódio e contra a qual se canaliza esse mesmo ódio; separação do chefe do inimigo do seu povo, criando a ideia de que ele age independentemente dos seus concidadãos, é um «mau pastor» e não pode ser confundido com os outros; mobilização dos escritores e artistas nacionais para participarem no combate com as suas armas especiais, utilização das autoridades morais da nação, sejam elas civis ou religiosas; finalmente, combinando história e religião reconstituição do mito nacional, organizando dessa forma uma espécie de constelação mitológica, como seja, e na peugada de Jean-Paul Gourevitch, «o exército garante a ordem e a vitória, a escola é fonte de progresso e de prosperidade, a República gera felicidade, a colonização é a forma de exportação do ideal” (Afonso; Gomes, 2013: 324).

É evidente que o extraordinário desenvolvimento das técnicas e meios de comunicação ficaram muito a dever ao espetacular desenvolvimento científico e tecnológico. Nomeadamente: a mecanização da imprensa; o desenvolvimento da fotografia; o cinema; a aparição do microfone e da rádio. Estes meios de comunicação, atualizados constantemente, e postos ao serviço da propaganda, juntamente com outros que, entretanto, se foram inventando a um ritmo impressionante, tiveram um impacto fundamental não só na condução como no desfecho da guerra.

Tal como hoje, o alvo era a «massa», a opinião pública nacional e internacional.

Harold Lasswell, citado por António Ventura (in: ob. cit.: 324), afirmava “«nem bombas nem pão, mas palavras, imagens, canções, paradas, e outros engenhos similares. Eram esses os instrumentos com os quais se fabricava a propaganda, a qual utilizava símbolos para conseguir o seu fim último - manipular as atitudes coletivas»”.

Na Grande Guerra, todos os beligerantes se confrontaram com problemas de mobilização dos espíritos, construindo, cada um, a seu modo, estruturas para fazer circular a propaganda e a contrapropaganda, funcionando como um sistema político coerente.

A Alemanha foi a que apresentou uma melhor preparação quando rebentou o conflito em 1914. Possuía dois organismos distintos: o departamento da imprensa, ligado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e uma secção de política dependente do Estado-Maior do Exército (OHL). O seu objetivo era manter o moral das tropas e das populações. Através de conferências, sessões de cinema, teatro, jornais e, inclusive, a criação de bibliotecas.

Em França, embora não existissem estruturas oficiais de propaganda, o princípio da desforra estava muito interiorizada na consciência da população gaulesa contra a Alemanha e era muito grande, logo após a anexação da Alsácia e parte da Lorena, em 1871. Mas, depois do eclodir da Grande Guerra, em 1916, é criado um comissariado de propaganda para o estrangeiro e um serviço de guerra psicológico. A Maison de Presse, na dependência do Ministério dos Negócios Estrangeiros, coordenava a propaganda no estrangeiro, desempenhando a Agência Havas um papel de grande relevo.

Na Grã-Bretanha, a propaganda estava mais estruturada e intensificou-se com o início do conflito. As primeiras organizações de propaganda eram privadas, como o Central Committee for National Patriotic Organisation, criado em 1914. Uma vez que na Grã-Bretanha o serviço militar, inicialmente ao deflagrar do conflito, não era obrigatório, de pronto se criou toda uma retórica no sentido do chamamento constante da população a participar no esforço de guerra, não só para a incorporação voluntária nas fileiras, prestando serviço na frente da batalha, como na retaguarda. Com a instituição do serviço militar obrigatório, em 1916, aparece então o Foreign Office, com funções de informação, e a Wellington House, onde funcionava o War Propaganda Burreau (WPB), com preocupações de preparar material em diversas línguas (espanhol, grego, árabe, chinês, japonês, etc.). Por exemplo, para Portugal e o Brasil, produziu-se a revista O Espelho. Em 1917 e 1918, foram criados outros departamentos cuja função era a melhor coordenação das diversas iniciativas, dentro das primeiras regras da propaganda moderna em que a preocupação primordial era o de se criar uma atmosfera propícia a que depois a verdadeira propaganda surgisse e fosse eficaz, correspondendo a uma linha política definida, não cedendo a equívocos e a contradições, suscetíveis de enfraquecimento dos argumentos, possibilitando o desmentido do adversário. Ou seja, os factos a enunciar devem ser «controlados» por forma a evitar os desmentidos e a não criar uma ideia de falsidade. Uma ideia fulcral de propaganda era o de se concentrar o seu foco nos elementos mais fracos do inimigo, desmoralizando-o ou desestabilizando as suas alianças. Neste campo, os prisioneiros, libertados ou não, constituíam uma arma essencial.

Os Estados Unidos são um caso à parte. Entraram tarde na guerra (1917) e, dada a posição não intervencionista inicial, e à reiterada posição não intervencionista de W. Wilson, na segunda campanha para a presidência, os conceitos e organização da propaganda e da contrapropaganda tiveram de ser diferentes: primeiro, para justificar a beligerância; depois, para não ferir muito a suscetibilidade de grande parte da sua população que pertencia ou era oriunda das Potências Centrais. O Committee on Public Information (CIP), dirigido por um jornalista e autodidata - George Creel - tinha a missão de promover a opção belicista no interior e no exterior dos Estados Unidos. O CPI recrutou centenas de funcionários e colaboradores nos meios de negócios, da comunicação social, das universidades e do mundo das artes, criando meios avançados e inovadores de publicidade, tendo em atenção uma adequada compreensão, objetiva e dinâmica, daquilo que é a psicologia humana. Indiscutivelmente foi nos Estados Unidos que esta atividade de propaganda e contrapropaganda se estruturou mais profunda, articulada e fundamentadamente, constituindo um marco histórico da propaganda política ao serviço de um governo e de um estado. A preocupação na feitura de guiões, comunicados e artigos, veiculando o ponto de vista e as diretrizes oficiais foi uma constante. Embora «oficialmente» os diferentes órgãos de comunicação social não fossem obrigados a veicularem-se àqueles pontos de vista, publicavam, contudo, o material que lhes era dado pois «sabiam» que «o mais aconselhável» era que o fizessem. O leitmotif, com um efeito global, da propaganda, essencialmente da americana, assentava na «diabolização» da Alemanha, utilizando, profusamente, o apelo emocional, bem patente de um modo especial nos cartazes e nos bilhetes-postais ilustrados tão em voga. Na opinião de Marc Ferro, os norte-americanos foram os mestres incontestáveis daquilo que ele designa por «intoxicação». E ilustra o seu ponto de vista acareando alguns exemplos. Um deles é um panfleto, lançado pela aviação americana, em agosto de 1918. Reza assim: “«Sereis ainda tão fortes como o éreis em julho de 1918? Os vossos inimigos tornaram-se, cada dia que passa, mais fortes ou mais fracos? Acaso as terríveis perdas sofridas em 1918 vos trouxeram a paz vitoriosa prometida pelos vossos chefes? Tendes ainda a esperança na vitória final? Estais prontos a sacrificar a vida por uma causa sem esperança»” (Ferro, 2008: 150-151). O segundo é um texto que acompanha um bilhete-postal, uma reprodução exata dos usados no exército alemão, com o seguinte teor: “«Escreva a morada de sua família e, se for feito prisioneiro pelos Americanos, dê-o ao seu primeiro oficial que o interrogar. Ele enviá-lo-á à sua família para que esteja sossegada sobre o seu destino»” (Ferro, 2008: 151). E, do outro lado do postal, o seguinte texto: “«Não estejam preocupados comigo. Para mim a guerra acabou. O Exército americano dá aos seus prisioneiros a mesma alimentação que aos seus próprios soldados: carne, pão branco, batatas, feijões, ameixas, café, manteiga, tabaco, etc.»” (Ferro, 2008: 151). Para quem, na retaguarda, sabia o que era a penúria e a fome, com nítida repercussão também na frente de batalha, este meio e conteúdo de propaganda é, simplesmente, magistral!

15
Mai15

Poesia e Fotografia 88

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

TROVA

 

Beira da Serra da Estrela

Onde o sol finge de lua...

Soturna e magra courela

Que lã de ovelhas debrua...

 

Vide, 18 de Outubro de 1943

26670627a.jpg

14
Mai15

Grande Guerra (1914-1918) - 24

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

2.3.- Novas táticas e métodos de fazer guerra

2.3.1.- Tática de rutura

 

O objetivo era romper as linhas inimigas, procurando tomar de assalto as trincheiras do exército rival e, com isso, ganhar terreno.

As novas táticas e processos de combate vieram principalmente do lado alemão. Mas foram constantemente aperfeiçoando-se, de parte a parte. Ludendorff escreveu uma série de diretivas que, para aquele tipo de guerra, foram o padrão no que se refere às iniciativas de ataque:

  • Ação maciça e demorada preparação de artilharia, seguida de assalto;
  • Táticas de infiltração com emprego de tropas especiais de assalto;
  • Barragem rolante;
  • Sincronização do tiro de artilharia com progressão de infantaria;
  • Ataque sem preparação da artilharia «para assegurar surpresa» (Magnoli, 2006: 349).

Foram estes, entre outros, os processos utilizados contra o soldado toupeira da Grande Guerra, durante os quatro anos de guerra nas trincheiras.

Mas nesta Frente não logrou muito intento. Foram demasiadas vítimas para tão poucos metros ou quilómetros conquistados. Na Frente Leste e Italiana, face à fraqueza dos exércitos russos e italianos, estas táticas lograram algum efeito.

 

2.3.2.- Tática de desgaste militar

 

Usando todos os meios bélicos disponíveis - e que constantemente se iam aperfeiçoando ou inventando -, desde a artilharia pesada (com a sua maior precisão de tiro) ao uso de armas químicas (como os diferentes tipos de gases), à aviação (quer como uso no reconhecimento das posições inimigas quer como meio de combate), até à invenção do carro de combate (tanque), o intuito era dizimar o exército rival, causando-lhe o maior número possível de baixas com a finalidade de lhe baixar a moral para, por fim, capitular.

 

2.3.3.- Tática de diversão

 

Entre muitas, apresenta-se a aposta de Winston Churchill para afetar psicologicamente os alemães. Pretendia-se derrotar os turcos, aliados dos alemães e, simultaneamente, auxiliar os russos, carentes de material de guerra, ficando assim mais fortes na frente leste e obrigando os alemães a um esforço e desgaste maior, aliviando a pressão na frente ocidental. Contudo, esta tática saiu cara aos Aliados, como mais à frente desenvolveremos: os turcos, com a ajuda dos alemães, derrotaram os Aliados na Batalha de Galípoli e, desta feita, o objetivo não foi conseguido. Winston Churchill demitiu-se do Almirantado e foi para a Frente combater, embora tenha depois regressado novamente ao governo.

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(Divisões ANZAC desembarcam em Galípoli, 1915) 

14
Mai15

Poesia e Fotografia 87

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

BILHETE

 

Nada me dês nem peças.

E não peças

O que podias dar e receber.

Fecha a própria riqueza do teu ser.

 

Um de nós era a mais

à lírica janela...

Olharam-se os zagais,

Mas não houve novela.

 

A vida assim o quis,

A vida sem amor.

Não regues a raiz

Do que não teve flor.

 

Coimbra, 15 de Setembro de 1943

2010 - Alanhosa [Santa Catarina] 032.jpg

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