TORGA EM CHAVES
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Amor
A jovem deusa passa
Com véus discretos sobre a virgindade;
Olha e não olha, como a mocidade;
E um jovem deus pressente aquela graça.
Depois, a vida do desejo enlaça
Numa só volta a dupla divindade;
E os jovens deuses abrem-se à verdade,
Sedentos de beber na mesma taça.
É um vinho amargo que lhes cresta a boca;
Um condão vago que os desperta e toca
De humana e dolorosa consciência.
E abraçam-se de novo, já sem asas.
Homens apenas. Vivos como brasas,
A queimar o que resta da inocência.
Miguel Torga, in "Libertação"
Se Torga fosse vivo e, numa das suas habituais instâncias, nas Termas de Chaves, visse o uso que acabam de dar a este soneto e à (pseudo)escultura que o acompanha, outro desabafo, concerteza, não teria senão este:
- Que coisa tão cafona!
O nosso escritor e poeta transmontano não poderia aprovar um uso tão banal, que suporta a sua obra.
Torga falou sempre com elevação e altivez de um transmontano. De um humanista que olhava para o «ser português» com grande elevação. E não de banalidades... que outros por essa Europa já quase sem valores, profundamente superficial e narcisista, nos mostra e traz.
Miguel Torga fala-nos de uma raiz autêntica, nossa. Não de reles imitações como esta.
E Chaves, e principalmente Torga em Chaves, merecia mais e muito melhor!
Augusto Santos Zassu