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zassu

30
Jan14

Poesia e Fotografia 09

 

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

HISTÓRIA ANTIGA

 

Era uma vez, lá na Judeia, um rei.

Feio bicho, de resto;

Uma cara de burro sem cabresto

E duas grandes tranças.

A gente olhava, reparava, e via

Que naquela figura não havia

Olhos de quem gosta de crianças.

 

E, na verdade, assim acontecia.

Porque um dia,

O malvado,

Só por ter o poder de quem é rei

Por não ter coração,

Sem mais nem menos,

Mandou mantar quantos eram pequenos

Nas cidades e aldeias na Nação.

 

Mas,

Por acaso ou milagre, aconteceu

Que, num burrinho pela areia fora,

Fugiu

Daquelas mãos de sangue um pequenito

Que o vivo sol da vida acarinhou;

E bastou

Esse palmo de sonho

Para encher este mundo de alegria;

Para crescer, ser Deus;

E meter no inferno o tal das tranças,

Só porque ele não gostava de crianças.

 

Coimbra, 12 de Outubro de 1937 (Diário I)

 

28
Jan14

Poesia e Fotografia 08

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA 

 

 

SOMBRA

 

 

Um pinheiro.

Olho esta vida aqui no areal, 

Serena, ao vento, ao sol e ao cheiro

Deste mar animal;

 

  

Meço-lhe o pé seguro, 

A largura dos braços e a certeza 

Que tem de cima a baixo de ser duro 

Conforme lhe mandou a natureza;

  

 

E deito-me à sombra dele, no chão, 

- No mesmo chão onde eu não pude ser 

Nada mais do que um bicho anão 

A gemer.

 

Buarcos, 20 de Agosto de 1937 (Diário I)

 

27
Jan14

Poesia e Fotografia 07

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA 

 

 

BUCÓLICA

 

 

A vida é feita de nadas: 

De grandes serras paradas 

À espera de movimento; 

De serras onduladas

Pelo vento.

 

 

De casas de moradia

Caídas e com sinais 

De ninhos que outrora havia

Nos beirais;

 

 

De poeira; 

De sombra de uma figueira; 

De ver esta maravilha: 

Meu Pai a erguer a videira 

Como uma mãe que faz a trança à filha.

 

São Martinho de Anta, 30 de Abril de 1937 (Diário I)

 

 

25
Jan14

Desencontro(s) - Cena 7:- E agora?...

E AGORA?...

 

 

 

  

Nas minhas frequentes deambulações pelas ruas da Baixa do Porto, ou pelos Centros Comerciais da sua área metropolitana, não raro dou comigo a entrar em livrarias e ali passar às vezes horas na ânsia de encontrar um ou outro título sucetível de me fornecer algumas respostas para as minhas interrogações, dúvidas e inquietações quanto ao significado e modo de funcionamento do mundo e da sociedade em que vivemos, que, cada vez mais, se afasta e escapa, muitas vezes, à minha compreensão.

 

Contudo, uma coisa tenho como manifestamente adquirida: lenta, e inexoravelmente, a lógica neoliberal, com a sua consequente inevitabilidade dos «mercados», está-nos avassaladoramente invadindo e a reduzir o cidadão a puro objeto de mercadoria, transformando a(s) democracia(s) em que vivemos numa pura encenação, verdadeira mascarada de um circo em que o comum dos cidadãos não passam de simples marionetas nas mãos de «uns outros tantos», muito poucos.

 

Esta convicção ficou em mim mais arraigada, quando, ainda há pouco, acabei de ler um interessante livro de um dos mais reputados sociólogos e politólogos alemães da atualidade – Wolfgang Streech.

 

A obra em questão, publicada em 2013 pela Conjuntura Actual Almedina (Grupo Almedina), tem o título «Tempo comprado – A crise adiada do capitalismo democrático». Que não é mais que um conjunto de lições, no âmbito do Instituto Adorno, Frankfurt, naturalmente mais desenvolvidas, que o autor deu em Junho de 2012.

 

Streech, logo na Introdução à obra, alerta (páginas 10 e 11):

 

“Felizmente, ninguém irá considerar-me qualificado para apreciar a obra de Adorno. Também abdiquei de procurar ligações entre aquilo que tenho a dizer e a herança de Adorno; fazê-lo pareceria forçado e arrogante. A existirem pontos em comum, serão muito gerais. Um deles, por exemplo, será a minha recusa intuitiva em acreditar que as crises têm de acabar sempre bem – uma intuição que creio encontrar também em Adorno (…) Adorno não oferecia qualquer garantia de que, um dia, o equilíbrio se recuperaria por si. Não conseguia chegar à confiança funcional de Holderlin - «Pois onde existe perigo, medra também a salvação». (…) Os diversos tipos de ordem social parecem normalmente frágeis e precários e considero as surpresas desagradáveis algo possível a qualquer altura. Também considero incorreto exigir a alguém que descreve um problema que apresente uma solução juntamente com a análise do mesmo (…) Alguns problemas podem ser de tal natureza que não têm solução ou, pelo menos, esta não é exequível aqui e agora. Se alguém me perguntasse, em tom de acusação, onde está, então, «o aspeto positivo», a pergunta acabaria por constituir uma oportunidade para eu invocar Adorno, cuja resposta – seria, sem dúvida: «E se não houver nada de positivo»?

 

Um pouco mais à frente, na mesma Introdução (páginas 13 a 25), inscreve:

 

“O que era característico da teoria da crise da «Escola de Frankfurt» era o pressuposto heurístico da existência, por um lado, de uma relação de tensão fundamental entre a vida social e, por outro, uma economia dominada pelos imperativos de valorização e multiplicação do capital – uma relação tensa que, de forma multifacetada e em contínua evolução histórica, foi transmitida na estruturação do capitalismo democrático no período pós-guerra (…) Ao retomar as teorias dos anos 70 e tentar atualizá-las à luz da evolução capitalista nas quatro décadas seguintes, encaro a crise atual do capitalismo democrático numa perspetiva dinâmica, inserida numa sequência evolutiva (…) A crise do capitalismo tardio, nos anos 70, não pode passar desapercebida mesmo àqueles que não tinham qualquer interesse no desmoronamento ou na autodestruição do mesmo. Eles também sentiam as tensões diagnosticadas – de forma mais ou menos correta – pela teoria da crise e reagiram-lhes. Vistas da perspetiva atual, estas reações parecem uma compra de tempo com ajuda de dinheiro – aliás, uma compra bem sucedida a médio prazo. Apesar de tudo, assim foi durante quatro décadas. «Comprar tempo» é a tradução literal de uma expressão inglesa: buying time – o que significa adiar um acontecimento iminente, na tentativa de ainda o impedir. Para tal, não é absolutamente necessário utilizar dinheiro. Porém, neste caso, foi utilizado e em grandes quantidades: aproveitando o dinheiro – a instituição misteriosa da modernidade capitalista – para apaziguar conflitos sociais potencialmente desestabilizadores, primeiro através da inflação, depois através do endividamento do Estado, a seguir, através da expansão dos mercados de crédito privados e, por fim – actualmente – através da compra da dívida de Estados e bancos pelos bancos centrais. (…) o adiamento e prolongamento da crise do capitalismo democrático dos anos pós-guerra, através da compra de tempo, estão estritamente associados ao processo, notável, de evolução capitalista que designamos como «financeirização». (…) Ninguém pode – depois daquilo que aconteceu desde 2008 – compreender a política e as instituições políticas sem as pôr numa estreita relação com os mercados e os interesses económicos, assim como as estruturas de classe e os conflitos de dela resultam. Se e em que medida esta posição é «marxista» ou «neomarxista» é uma questão que me parece completamente desinteressante e que não pretendo abordar, pois faz parte do resultado da evolução histórica já não ser possível dizer, atualmente, com segurança, onde, no esforço de esclarecimento dos acontecimentos em curso, acaba o neomarxismo e começa o marxismo. Aliás, as ciências sociais modernas, sobretudo quando se debruçam sobre as sociedades com tal e sobre a evolução das mesmas, não podem prescindir do recurso a elementos centrais das teorias «marxistas» – mesmo que seja para se definirem a si mesmas em contradição com estas. De qualquer modo, estou convencido de que, sem utilizar determinados conceitos cruciais que remontam a Marx, não é possível compreender minimamente a evolução pela qual as sociedades modernas estão a passar atualmente e que isto é tanto mais verdadeiro quanto mais óbvio se torna o papel impulsionador da economia de mercado capitalista em desenvolvimento na sociedade mundial emergente.”

 

Este é, pois, o pano de fundo da Introdução do livro.

 

Abandonemos um pouco as páginas do texto que depois segue e paremos agora no subtítulo «A política do Estado endividado». Atentemos ao quadro da página 129 que o autor nos apresenta:

 

 

 

Deixemos um pouco o autor explica-lo um pouco:

 

“Gostaria de propor (…) um modelo estilizado do Estado endividado atual como destinatário e mandatário de dois coletivos constituídos de forma diferente e como um sistema intermediário entre dois submundos em conflito. Estes funcionam segundo lógicas tendencialmente incompatíveis. Contudo, a política atual tem, apesar disso, de responder, tanto quanto possível, simultaneamente, a ambas: a população (o povo do Estado), por um lado, e os «mercados» (o povo do mercado) por outro.

O povo do Estado está organizado a nível nacional e é constituído por cidadãos ligados a um Estado, perante o qual podem fazer valer os seus direitos cívicos inalienáveis. Estes direitos incluem a possibilidade de, enquanto eleitores, manifestarem a sua vontade em eleições periódicas. Nos períodos entre eleições, os cidadãos influenciam as decisões dos seus representantes constitucionais na medida em que, levantando a sua voz, participam na criação de uma «opinião pública». Em troca desta possibilidade, os cidadãos devem lealdade ao Estado democrático, o que inclui o pagamento de impostos, cuja utilização é deixada, por princípio, à livre decisão das autoridades competentes. A lealdade dos cidadãos pode ser considerada uma contrapartida pelo contributo do Estado para a prestação de serviços de interesse geral, em especial para a garantia de direitos sociais, baseados na democracia.

O Estado democrático governado pelos seus cidadãos e, enquanto Estado fiscal, alimentado pelos mesmos, transforma-se no Estado democrático endividado mal a sua subsistência deixa de depender exclusivamente das contribuições dos seus cidadãos para passar a depender, em grande parte, também, da confiança dos credores. Ao contrário do povo do Estado do Estado fiscal, o povo do mercado do Estado endividado está integrado a nível transnacional. A única ligação que existe entre os membros do povo do mercado e os Estados nacionais é a dos contratos: estão ligados como investidores e não como cidadãos. Os seus direitos perante o Estado não são públicos, mas sim privados: não se baseiam numa constituição, mas no direito civil. Em vez de direitos civis difusos, passíveis de ser alargados do ponto de vista político, os membros do povo do mercado possuem direitos perante o Estado cuja aplicação pode ser exigida em tribunais cíveis e terminar através do cumprimento do contrato. Enquanto credores, não podem eleger outro governo em vez daquele que não lhes agrada; mas podem vender os seus títulos de dívida ou não participar nos leilões de novos títulos de dívida. O juro pago por esses títulos, que reflecte o risco estimado pelos investidores de não recuperação total ou parcial dos seus investimentos, constitui a «opinião pública» do povo do mercado – e uma vez que esta é expressa de forma quantificada, é muito mais precisa e legível do que a do povo do Estado. O Estado endividado pode esperar lealdade do seu povo, enquanto dever cívico, enquanto no que diz respeito ao povo do mercado tem de procurar conquistar a sua «confiança», pagando devidamente as suas dívidas e provando que poderá e quererá fazê-lo também no futuro.

Para perceber o funcionamento do Estado democrático endividado, temos de começar por nos admirar por, ao que parece, ninguém saber realmente quem são os «mercados» tão importantes para ele. A literatura, pelo menos a das ciências sociais, fala pouco sobre a forma como se chega aos preços que os Estados têm de pagar pelos créditos que lhes foram concedidos. A imprensa diária ou semanal não diz quase nada sobre o assunto. O que sabemos é que todos os Estados vendem títulos de dívida várias vezes por ano, muitas vezes para refinanciar dívidas antigas; isto significa que praticamente está sempre a ocorrer um leilão em qualquer parte do mundo. A teoria económica parece supor como evidente que o mercado de dívidas soberanas é um mercado perfeito e não quer pôr essa suposição em causa. Provavelmente por isso, é quase impossível encontrar dados sobre a estrutura do lado da procura. A facilidade de acesso a estatísticas sobre quotas de mercado e taxas de concentração noutros setores da economia, quer a nível nacional, quer a nível global, torna a referida situação ainda mais surpreendente (sublinhado nosso). Conhecem-se os nomes de alguns fundos ativos no mercado de dívidas soberanas, com a Calpers e a PIMCO (Pacific Investment Management Company). Mas não se sabe se, neste caso, tal como acontece noutros mercados, também existe um pequeno grupo de grandes empresas que lidere o mercado e regule os preços. Sabe-se que os ministros das Finanças de muitos Estados procuram contactos com a PIMCO para se aconselhar com seu presidente do conselho de administração sobre a política orçamental nos seus países. Não existe legislação antitrust a nível internacional que proíba acordo entre líderes de mercado ou a revelação pública das decisões de compra que estão ou não planeadas; ao contrário do que acontece com as concertações de preços entre fabricantes de cimento ou de roupa interior, se os principais fundos do mundo revelassem, por exemplo, numa teleconferência, que não iriam participar no próximo leilão de títulos de dívida francesa, isso não seria punível.

Os Estados democráticos endividados têm de se mover entre as suas duas classes de stakeholders, para satisfazer ambas, pelo menos até ao ponto de estas não lhe negarem totalmente a sua lealdade ou a sua confiança, conforme o caso. Ao fazê-lo, têm de estar atentos para não se deixar dominar demasiado por nenhuma das partes, uma vez que isso pode desencadear uma crise na relação com a outra parte. Um Estado democrático endividado só pode satisfazer os seus credores se os seus cidadãos continuarem a colaborar com ele. Se aparecer aos olhos destes como o braço prolongado dos seus credores, existe o perigo de se recusarem a obedecer-lhe. Ao mesmo tempo, um Estado deste tipo só pode afirmar a sua legitimidade perante os seus cidadãos – e, em especial, perante os cidadãos contribuintes que lhe restaram, apesar da internacionalização – se os seus credores estiverem dispostos a financiar e refinanciar as suas dívidas em condições aceitáveis para ele e para os seus cidadãos. Esta disponibilidade diminuirá ou desaparecerá se um Estado for demasiado ao encontro dos sues cidadãos, gastando recursos que poderão faltar-lhe no serviço da dívida. A orientação de um Estado endividado por uma das duas partes é decidida pelo poder relativo das mesmas. Este depende, por seu lado, da probabilidade e gravidade que a retirada de confiança ou lealdade tenha para o Estado e o seu governo.

O conflito, característico da política do Estado democrático endividado, entre as suas duas comunidades de reivindicações, em luta pelo controle deste, é um fenómeno novo, ainda em evolução e praticamente por estudar. Há muitos motivos para considerar que o surgimento do capital financeiro como um segundo povo – um povo do mercado, que rivaliza com o povo do Estado – constitui uma nova fase da relação entre o capitalismo e a democracia na qual o capital deixou de influenciar a política apenas indirectamente – através do financiamento ou não do próprio Estado. A investigação crítica da democracia dos anos 60 e 70 analisou a forma como os Estados democráticos do período pós-guerra conseguiram garantir, melhor ou pior, a sua legitimidade democrática, apesar da posição realmente de exceção dos seus cidadãos que dispunham de meios de produção e investimento. O retrocesso, rápido e fortemente dominado por uma classe política, da organização e participação democrática no processo de liberalização, assim como a restrição crescente do espaço político de manobra ao longo da sequência de crises das quatro últimas décadas poderiam significar que não é fácil conseguir algo semelhante após a transição do Estado fiscal para o Estado endividado”.

 

Após a leitura desta obra e, particularmente, depois da longa citação que acabámos de fazer, uma interrogação se nos põe: E agora?...

 

É certo que o autor já na Introdução nos alertava para a possibilidade de não haver finais de crise felizes. Mais uma vez a resposta de Adorno, formulada em termos de interrogação, é de todo pertinente - «e se não houver nada de positivo» nisto tudo que estamos fazendo?

 

Obviamente que esta pergunta/resposta, aqui e agora, para a classe política – os que têm mais directamente a responsabilidade de levar por diante as tarefas dirigidas ao povo do Estado - é completamente indefensável. Exige-se uma saída!... Razão pela qual o autor que vimos citando, malgré tout, no final da sua obra, e com alguma timidez, diz-nos, a páginas 272-273:

 

“O euro foi e é uma criatura resultante da euforia da globalização dos anos 90, de acordo com a qual a capacidade de acção dos Estados não é só obsoleta, como indispensável. A exigência de um Bretton Woods europeu, no contexto da viragem neoliberal prestes a ficar concluída, seria o equivalente de um programa de reformas para rebentar com o sistema nos anos 70: uma resposta estratégica a uma crise sistémica que aponta para além do sistema cuja crise procura resolver, demonstrando que não pode existir neste mundo democracia social sem soberania estatal.

A exigência de desmantelamento da União Monetária enquanto projecto de modernização tecnocrática e socialmente implacável que expropria politicamente e divide economicamente os povos dos Estados – o povo europeu realmente existente – afigura-se-nos como uma resposta democraticamente plausível à crise de legitimação de uma política neoliberal de consolidação e racionalização que se considera a si própria como algo inevitável. Ela distingue-se fundamentalmente das exigências nacionalistas de exclusão da Eurolândia dos países que estão endividados; o seu objetivo não é punir, mas sim libertar e reabilitar os países que correm, hoje, o risco de cair definitivamente na prisão babilónica de um sistema de mercado sem controlo político, no qual lhes é atribuído o papel de eternos perdedores e pedintes”.

 

É este esforço de propositura, com a que acabamos de citar, que deve ser feita, entre outras, constituindo-se como uma verdadeira e autêntica alternativa, que se espera daqueles que designo de partidos da esquerda – da social-democracia e do socialismo democrático. Que, ao longo deste longo processo de construção europeia, se esqueceram de utilizar, enquadradas aos tempos modernos, as ferramentas básicas, matriciais marxistas, da interpretação e funcionamento da sociedade e da economia bem assim as propostas «generosas» de Proudhon, e se deixaram «corromper» pelo canto da sereia hayekiana, neoliberal, afastando-se do «seu povo».

 

Aqui, em «nossa casa», enquanto o Partido Socialista não for capaz, repito, de um esforço de propositura alternativa, e deixar de apresentar nada mais que o mesmo da solução neoliberal, não tem o direito moral de se apresentar a eleições e obter maioria (absoluta) para governar. Fazê-lo, sem ser verdadeira alternativa, é entrar no «jogo do gato e do rato»: mentir ao povo do Estado e satisfazer a vontade sempre insaciável do povo do mercado.

 

Será que António José Seguro e a sua «entourage» se apercebe do que, na crise atual por que passamos, do que está verdadeiramente em causa?

 

Segundo os peritos das ciências socias, não é fácil sair desta «quadratura do círculo» em que nos encontramos.

 

Mas é bem óbvio que quem tiver a paciência e a coragem de «seguir» o fio de Ariadne, entrando no labirinto e matando «a fera», é que poderá ser digno de um bom regresso ao seu lar e ser aclamado pelo seu povo!

 

 

Augusto Santos Zassu

23
Jan14

Poesia e Fotografia 06

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA 

 

CERTEZA

 

Não:

Nunca saberás quem eu sou.

Apesar destes beijos que dou

E destas ironias que te digo,

Vou contigo como vou

Ao lado de um inimigo.

 

Coimbra, 6 de Novembro de 1936 (Diário I)

 

21
Jan14

Poesia e Fotografia 05

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA 

 

FADO

  

Hoje a grande desgraça não fui eu:

Foi um velho navio que partiu

E me deixou no cais

Sem nenhum sonho mais.

 

  

Figueira da Foz, 15 de Agosto de 1936 (Diário I)

 

 

20
Jan14

Encontro(s): Cena 14:- O Barroso nos Diários de Miguel Torga

 

Negrões, Barroso, 28 de Maio de 1955 (Miguel Torga, Diário VII)

 

(Aldeã das Alturas de Barroso)

 

"Por mais que tente, não consigo reduzir estas vidas de planalto a uma escala de valores comuns. Foge-me das mãos não sei que força incomensurável, que, exatamente, por ser assim, se alcandora nos olimpos possíveis do mundo. Nada existe aqui de notável testemunhar uma atividade humana superior ou singular. Seres esquemáticos, num ambiente esquematizado. E, contudo, cada indivíduo parece trazer à sua volta um halo de intangibilidade divina.

 

Talvez seja a própria pobreza do meio que, despindo-os de todo o acessório, lhes evidencia a essência. E a nossa perturbação diante deles seria a perplexidade de pobres Adões cobertos de folhas diante de irmãos que permaneceram nus".

 

(«Os Cornos» das Alturas de Barroso)
18
Jan14

Poesia e Fotografia 04

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

 

IMAGEM

 

                   

Este é o poema de uma macieira. 

Quem quiser lê-lo, 

quem quiser vê-lo,

 

venha olhá-lo daqui a tarde inteira. 

 

Floriu assim pela primeira vez. 

Deu-lhe um sol de noivado, 

e toda a virgindade se desfez 

neste lirismo fecundado.

 

São dois braços abertos de brancura; 

mas em redor 

não há coisa mais pura 

nem promessa maior.

 

 

 

Vila Nova, 4 de Abril de 1936 (Diário I)

 

10
Jan14

Poesia e Fotografia 03

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

  

 

BRINQUEDO

 

  

Foi um sonho que eu tive: 

era uma grande estrela de papel, 

um cordel 

e um menino de bibe.

 

  

O menino tinha lançado a estrela 

com ar de quem semeia uma ilusão; 

e a estrela ia subindo, azul e amarela, 

presa pelo cordel à sua mão.

 

  

Mas tão alto subiu 

que deixou de ser estrela de papel. 

E o menino, ao vê-la assim, sorriu 

e cortou-lhe o cordel.

  

Coimbra, 6 de Fevereiro de 1936 (Diário I)

 

 

08
Jan14

Poesia e Fotografia 02

POESIA E FOTOGRAFIA

 

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

 

PRECE

  

 

Senhor, deito-me na cama 

coberto de sofrimento; 

e a todo o comprimento 

sou sete palmos de lama: 

sete palmos de excremento 

da terra-mãe que me chama.

 

  

Senhor, ergo-me do fim 

desta minha condição: 

onde era sim, digo não, 

onde era não, digo sim; 

mas não calo a voz do chão 

que grita dentro de mim.

 

  

Senhor, acaba comigo 

antes do dia marcado; 

um golpe bem acertado, 

o tiro dum inimigo... 

qualquer pretexto tirado 

dos sarcasmos que te digo.

  

Vila Nova, 11 de Dezembro de 1934 (Diário I)

  

 

(Caminho do Norte de Santiago - Dezembro de 2007)

 

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