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zassu

18
Set12

Encontro(s) - Cena três: Considerações à volta de um texto

ENCONTRO(S)

 

CENA TRÊS: CONSIDERAÇÕES À VOLTA DE UM TEXTO

 

Fui dar hoje com um interessante texto, no Facebook, na página pessoal de António Tété Pereira. Não resisto de o citar aqui e, depois, de acrescentar uma ou outra nuance sobre o mesmo:

"De todos os lados, e, a todo o instante, os “media” estão a transmitir-nos (massacrar-nos?) com mensagens, que apontam para o grave momento económico, social e político, por que passa o país, e as suas previsíveis consequências negativas, a todos os níveis, que, para muitos, atingirão, mesmo, as suas necessidades mais básicas.
 
 As pessoas, naturalmente, começam a ter muito medo, que é o sentimento pior, que pode afectar-nos, por que é ele a causa de todas as demais emoções negativas.
 
 Que fazer? – Perguntamo-nos.
 
As respostas, ou pretensas soluções, umas mais sábias, que outras, mas, aparentemente, todas plenas de convicção, estão, não só na boca dos políticos, mas, ainda, na de qualquer cidadão, em simples conversa de café, ou de amigos, sem que, à partida, se possa afirmar que a manifestada pelo cidadão anónimo não é mais sensata, do que a proferida por pessoas com responsabilidades de chefia e orientação. 
 
 A verdade é que, diríamos, geneticamente, todo o português se sente habilitado a dar  palpites, quando as coisas correm mal, e, tal, como no futebol, as soluções propostas variam, desde a substituição do treinador, à mudança de estratégia, desde a alteração de táctica, ao drástico sacrifício de  jogadores…
 
Como, popularmente, dizemos: cada cabeça, sua sentença. Contudo, há dois aspectos, nessas “discussões”, sobre os quais, gostaria de colher o Vosso pensamento.
 
 Um deles, tem a ver com o facto de, nunca, nenhum de nós, se sentir co-responsabilizado pelo que está a acontecer. A culpa está, sempre, além.
 
Outro, releva da circunstância de entendermos que qualquer solução tem de vir do exterior, já formatada e pronta a ser aplicada, sem qualquer esforço da nossa parte.
 
Ora, pensei eu, porventura, mal, que, se, em vez de culparmos terceiros, fizéssemos, antes uma auto-análise, uma auto-crítica, nos virássemos para o nosso interior, e nos interrogássemos, sériamente, em que é que o nosso comportamento tem contribuído para ao actual estado de coisas, talvez, descobríssemos, sem grande esforço, mas, com algum espanto, que, afinal, e, para dar alguns poucos exemplos, desde o consumismo desregrado, ao voto, mal orientado, passando pelo afrouxamento de valores nas nossas relações sociais, familiares, profissionais e pessoais, fomos verdadeiros actores e fautores do que, hoje, lamentamos.
 
Por outro lado, o exercício, acima proposto, implicando humildade, contém, em si mesmo, a resposta à segunda questão, deixada em aberto; ou seja, posso eu, que, nada, comando, contribuir para alterar o “panorama” angustiante, que nos sufoca?
 
A resposta vem de uma mulher simples, a Madre Teresa, que, num dos países, onde os índices de pobreza são chocantes (a Índia), quando perguntada se valia a pena o seu trabalho, perante, tanta miséria, num país de um bilião de pessoas, ela respondeu, sensívelmente, desta forma: “eu não tenho obrigação de salvar o mundo, mas, já me sentirei feliz se puder influenciar, positivamente, os que estão próximos de mim”.
 
Essa é, julgo eu, a sábia orientação: deixemos de nos lamentar, metamos a mão na consciência e vamos ao trabalho de ajudar, no que soubermos, e pudermos, por mais insignificante, que nos pareça, começando pelos familiares directos, pelas comunidades, mais próximas, com a certeza de que, deste modo, estamos a contribuir  para o aparecimento da “massa crítica”, que provocará  a mudança de mentalidades, pois, este, é, verdadeiramente, o cerne da questão.
 
Estarei errado?"

 

Não, de todo, meu caro António Tété Pereira. Estou, na generalidade, de acordo com o seu ponto de vista.

 

Gostaria, porém, de introduzir, na sua reflexão, uma ou duas nuances.

 

Quanto à questão da culpa. É certo que, em todas as questões da vida, podemos nelas introduzir juízos de moralidade e/ou éticos. Parece-me, contudo que, aqui, o que está mais em questão, porque de política se trata, é de responsabilidade. Obviamente, cada um de nós, como cidadãos que somos, temos responsabilidades. Pelos nossos comportamentos objectivos, no que respeita às nossas escolhas, quer de consumo, quer políticas. Porque, como seres livres, temos capacidade de escolha.

 

Contudo, há graus de responsabilidade, como sabe, sem que, com este “mas”, queira excluir a quota-parte de responsabilidade que, individualmente, a cada um de nós nos cabe.

 

Temos de ver as coisas para além das suas próprias aparências. Isto é, temos de ser cidadãos lúcidos. Tentarmos perceber como a sociedade funciona. Que sistema nos rege e em que vivemos.

 

Embora fazendo uma leitura crítica de Marx, considero ainda que, apesar de tudo, continua a sua obra, no seu todo, a ser uma útil ferramenta, adoçada por outras, para a compreensão dos mecanismos da sociedade em que vivemos.

 

E também sabe que, a partir de 1973, com a crise petrolífera, após a enorme expansão dos 30 anos gloriosos, em que se instalou, na Europa, o Estado de Bem Estar Social, o capitalismo entrou em crise (embora haja autores que a identifiquem antes). A crise petrolífera funcionou como o elemento mais visível do enorme icebergue que se estava levantando do mar agitado da produção fordista. Aqui temos de relevar da enorme importância que a ciência e a nova tecnologia veio trazer ao novo modo de produção. Em particular o papel essencial das novas tecnologias da informação e comunicação. Com elas, o capitalismo, na sua feição mais hodierna, o financeiro, passou a poder contornar o poder dos estados e a impor, mundialmente (globalmente), as suas regras.

 

Aquilo que hoje designamos por neoliberalismo não é, nada mais nada menos, que o império do mercado sobre a sociedade civil e, fundamentalmente, sobre os estados, apoiado pelo capitalismo financeiro.

 

E, aqui, o que se critica, é a incapacidade da classe política, quer a nível nacional, quer internacional, de pôr cobro a esta situação – de ter capacidade, de exigir e regulamentar o mercado. Mesmo o financeiro.

 

Incapaz ou conivente?...

 

E nem se diga que o mercado é de efectiva concorrência. Sabemos muito bem que não. Sabemos que o que impera é a lei das multinacionais, que ditam as suas próprias regras – num mercado distorcido, de verdadeira concorrência imperfeita!

 

Tudo, para este sistema em que vivemos, é mercadoria. Tudo se vende. Mesmo até a própria cultura. Tradições. Territórios. Gentes…

 

Dinheiro e lucro fácil é a regra de oiro.

 

Os meios de comunicação, em particular a televisão, entram neste monumental jogo. Melhor, fazem parte desta lógica infernal, desde o marketing até à publicidade. Nem as próprias campanhas eleitorais escapam… Os candidatos apresentam-se como ”imagens vendáveis”. Entram neste jogo do “faz de conta”. Que depois se vê…

 

Para a imensa maioria dos políticos, ou candidatos a tal, ao se assumirem como um produto, uma mercadoria, transformam-nos, a todos nós, em clientes/consumidores. Enganamo-nos quando, em eleições, estamos em presença de políticos/representantes e eleitores/cidadãos. Tudo não passa de um enorme “fetiche”!

 

Não foi o cidadão comum que facilitou, de forma despudorada, o crédito. Tudo foram facilidades, facilidades, e mais facilidade. O depois? O depois logo se vê... Este era o engodo!

 

Apesar de todos nós sabermos que o dinheiro não é inelástico. Que funciona em função da capacidade produtiva de cada economia local, regional e nacional...

 

O que fizemos com as especiarias da Índia e o ouro do Brasil? Medrar as classes ociosas, com dinheiro fácil, não dando verdadeiro valor ao trabalho. E os euros da Europa, que deveriam ter servido mais para nos apetrechar para as tarefas de um novo Portugal, que se queria construir, verdadeiramente europeu, investindo, a sério, na educação e formação dos portugueses? É preciso responder?...

 

 A educação, como paixão, não passou de mera retórica!...

 

E, entretanto, quem nos governa(ou), o que faz (fizeram)? Deixaram-se ir na onda. Mais. Usaram-na, alguns deles, de uma forma impune e criminosa, sem qualquer sentido de estado e de serviço público.

 

Obviamente, temos responsabilidades. Todos. Porque gerados, nados e criados neste "cadinho de cultura". Do "deixa ir". Do "fartar vilanagem". Sem sentido algum da importância do bem comum e da coisa pública.

 

 Até que nos entram no bolso…

 

E gritamos. Protestamos.

 

Finalmente, protestamos!

 

Mas urge interiorizar este veemente protesto.

 

Que exige mudanças. A começar por cada um de nós. De interiorizarmos que, em democracia, não basta apenas votar (aqueles que votam!) nos actos eleitorais, quando a isso são solicitados. É necessário, desde o local onde vivemos, até ao país que herdámos dos nossos avoengos, termos uma voz activa. Todos os dias. Fazer das ruas e das instituições não ágoras de protesto, mas de governo efectivo. Pela participação efectiva. Pela acção cidadã, quotidianamente, em prole da coisa pública, do bem público, dos assuntos a que todos nos tocam. Como seja, cada um dizer, mesmo, para onde quer que vá o seu dinheiro dos impostos! Os nossos irmãos brasileiros falam em “orçamento participativo”. Sabemos nós o que isso é?...

 

Não basta passarmos uma ”procuração” aqueles que elegemos e, depois, desleixarmo-nos dos nossos negócios. Devemos ter a atitude de um “bom pai de família”: termos sempre, e a todo o momento, de interpelarmos o nosso representante, pedindo-lhe contas dos assuntos que lhes delegámos.

 

E não temos feito isto! Desleixámo-nos. Por incúria. Ou por conivência. Ou ainda por fraca “densidade democrática”, alicerçada em níveis débeis de cidadania, herdados de uma sociedade que tem um sério problema em acertar passo com os novos tempos. Que vive muito das aparências.

 

Os resultados, enfim, estão à vista…

 

É certo que não temos, cada um de per si, capacidade de mudar o mundo, mas, se não começarmos, por pouco que seja, mada mudará.

 

Eu acredito nas mulheres e homens deste meu Portugal! Na capacidade de saberem lidar com os maus políticos e de, mesmo vivendo num sistema económico tão despersonalizado como este em que vivemos, darmos a volta por cima, fazendo valer os nossos próprios valores aos tecnocratas que olham para nós como se de uma simples mercadoria se tratasse. Honrando os nossos compromissos. Sem pactos leoninos!

 

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