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27
Abr15

Grande Guerra (1914-1918) - 8

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS)

 

 

II

A CORRIDA ÀS ALIANÇAS E OS FATORES DE PERTURBAÇÃO DO SUL DA EUROPA

 

2.2.- A Entente Cordiale

A não revalidação do Tratado de Ressegurança entre a Alemanha e a Rússia abriu portas a uma ligação de carácter formal, embora parecesse altamente improvável, entre o regime republicano francês, dito de vanguarda, e uma monarquia absolutista. Mas na diplomacia e na política, nem tudo o que parece é.

Em 23 de julho de 1891, uma esquadra francesa foi recebida com todas as honras no porto de Kronstadt pelo próprio czar. Em França foi o júbilo, erguendo-se um inflamado patriotismo. Era a saída do isolamento internacional da III República Francesa, com a oportunidade de arquitetar o seu sistema de alianças. Aqui não devemos, obviamente, neste feito, menosprezar o apoio das instituições financeiras francesas à construção do caminho-de-ferro transiberiano, como é evidente.

Em 1892, é celebrado entre os dois países um tratado de auxílio mútuo militar, o qual, na sua cláusula principal, estabelecia um compromisso que iria ter “um peso tremendo no processo de declaração de guerra em 1914” (Martelo, 2013: 122). Segundo essa cláusula, «se a França fosse atacada pela Alemanha ou pela Itália, apoiada pela Alemanha, a Rússia empregaria todos as forças disponíveis para atacar a Alemanha; se a Rússia fosse atacada pela Alemanha, ou pela Áustria apoiada pela Alemanha, a França empregaria todas as suas forças disponíveis para atacar a Alemanha».

Em 4 de janeiro de 1894, os dois governos aceitaram formalmente a aliança, a qual será conservada no maior secretismo. E teria a mesma duração da Tripla Aliança.

Estava a «armadilha» montada...

Com esta aliança, a Alemanha já não podia aspirar a uma guerra numa só frente, como tão obstinadamente Bismarck procurara. Com Bismarck fora da chancelaria e um novo kaiser, o sistema pelo qual a Alemanha gerira os assuntos europeus chegara ao seu termo. Inicia-se uma nova era.

Vejamos o «desabafo» do kaiser, Guilherme II junto do seu primo czar Nicolau II (Nicky): “Não é a amizade da França e da Rússia que me perturba, mas sim o perigo para o nosso princípio de monarquismo de estar a colocar a República no pedestal. O constante aparecimento de príncipes, grão-duques, etc., em paradas, funerais, jantares, corridas, juntamente com figuras de topo da República, faz com que os republicanos se julguem perfeitamente honestos, excelentes pessoas, com quem os príncipes devem conviver e sentir-se como em sua casa. Os republicanos são revolucionário de natura. A República Francesa provém da fonte da Grande Revolução e propaga as suas ideias. O sangue das Suas Majestades ainda está nesse país. Desde então, alguma vez voltaram a ser felizes ou ter paz? Não foram de banho de sangue em banho de sangue e de guerra em guerra até mergulharem toda a Europa e a Rússia num mar de sangue? Nicky, acredita em mim, a maldição de Deus abateu-se, para todo o sempre, sobre aquele povo. Nós, Reis e Imperadores cristãos, temos o sagrado dever, que nos foi imposto pelo Céu, de sustentar o princípio von Gottes Gnaden (pela Graça de Deus). Podemos ter boas relações com a República. Mas nunca intimidade!” (Martelo, 2013: 124).

Que tamanho proselitismo; que desabafo tão irónico. Mas os tempos eram marcados por esta mentalidade...

T. Delcassé, ao tomar posse como Ministro dos Negócios Estrangeiros da República Francesa, em 1898, tinha ideias muito claras quanto à política externa da República. Segundo ele, porque a Alsácia e a Lorena estavam na posse da Alemanha, o inimigo da França estava definido.

Assim, o relacionamento amistoso (e o apoio financeiro) à Rússia, potência confinante com o leste da Alemanha, era a peça essencial de qualquer projeto destinado a recuperar os territórios perdidos em 1871. Por isso o vemos em S. Petersburgo, em 1899, em visita oficial, ao encontro do czar, com vista ao reforço dos acordos selados em 1892 e 1894; por isso, na Exposição Universal de Paris de 1900, o lugar de maior destaque é dado aos pavilhões russos bem assim, nessa mesma altura, o Presidente da República E. Loubet inaugura a ponte com o nome do czar Alexandre III, sobre o rio Sena, em Paris.

A Grã-Bretanha começava a «trincar os lábios» - porque não lhe saía da cabeça aquele pavilhão alemão na Exposição de Paris. Mas, por algum tempo mais, continuaria, usando habilmente a sua diplomacia, vivendo no seu «esplendoroso isolamento».

Mas, tal como as coisas iam correndo, não por muito mais tempo...

A Grã-Bretanha, na qualidade de primeira potência mundial (assim era considerada) sentia-se, apesar de algumas nuvens carregadas, vocacionada para assumir compromissos com alguma ou algumas potências. Mas sentia que a sua velha política do «esplêndido isolamento» estava a chegar ao fim.

O seu ministro das Colónias J. Chamberlain, em 1898, afirmava: “«Todos os Estados poderosos da Europa concretizaram alianças, e, enquanto nos mantivemos de fora dessas alianças, enquanto fomos invejados por todos, enquanto tivemos interesses que, numa ocasião ou noutra, conflituam com os interesses de todos, é provável que sejamos confrontados, a qualquer momento, com uma combinação de Grandes Potências de tal modo poderosa que nem mesmo o mais descomedido e impetuoso político seria capaz de contemplar sem um certo sentimento de apreensão»” (Martelo, 2013: 125).

E não foi necessário muito tempo para que a evolução dos acontecimentos viesse dar razão a Chamberlain.

A Alemanha de Guilherme II ia marcando pontos sensíveis para o império britânico, nomeadamente na Turquia e em pontos nevrálgicos respeitantes à rota para a Índia, através do Suez. Talvez fosse agora o momento oportuno para Londres se convencer a abandonar a sua obstinada política de isolamento.

No novo governo, que entretanto se formou, em 1902, a pasta dos Negócios Estrangeiros ficou entregue a Lord Lansdowne que, contrariamente aos seus antecessores, estava disponível a uma maior aproximação à política continental, designadamente com o poderoso vizinho francês.

Após um bem recebido acolhimento do Rei Eduardo VII em Paris, os franceses não demoraram a mostrarem-se sensibilizados com o discurso ali proferido pelo rei inglês. Graças ao trabalho do hábil e astuto embaixador de França em Londres, Paul Cambon, o Presidente Francês, E. Loubet, acompanhado de Delcassé, visitou Londres, em mais uma jornada de conversações bilaterais, designadamente no tocante às pretensões de ambos no que respeitava aos países do norte de África.

Em 9 de abril de 1904, acertadas todas as divergências anteriores, em matéria de expansão colonial, os dois governos assinam o acordo que ficaria conhecido como Entendimento Cordial. Não se tratava, ainda, de uma aliança para fins de segurança mútua. Era, antes de tudo, uma declaração pública de futura cooperação, baseada na circunstância de terem sido resolvidos, a contento das partes, os principais diferendos entre os dois países (Martelo, 2013).

No final de 1905, instalava-se no governo britânico uma maior convicção de que havia uma maior utilidade em prosseguir a política de colaboração com as potências continentais que poderiam opor-se à Alemanha. Esta nova postura foi liderada por Sir Edward Grey, Ministro dos Negócios Estrangeiros do governo liberal, constituído em dezembro de 1905.

Grey entendia, mesmo inexistindo uma aliança formal, que se criara uma espécie de ligação moral com a França, que importaria ter em conta. Em fevereiro de 1906, escrevia: “Se houver uma guerra entre a França e a Alemanha, será muito difícil para nós ficarmos de fora. O Entendimento, e ainda mais, as constantes e enfáticas demonstrações de estima (oficiais, navais, políticas, comerciais e na imprensa) criaram em França a crença de que os apoiaremos na guerra... Se esta expectativa redundar num desapontamento, os franceses nunca mais nos perdoarão. Penso também que haverá um sentimento generalizado de que nos teríamos portado mal e deixado a França em apuros... Por outro lado, a perspetiva de uma guerra europeia e a ideia de nela nos vermos envolvidos é horrível” (Martelo, 2013: 128).

Figura 7.jpg

A Conferência sobre Marrocos, realizada em Algeciras, em janeiro de 1906, permitiu, pelas razões que de seguida iremos expor, na Segunda Parte, uma notória conjugação de esforços entre a França e a Grã-Bretanha para que o Entendimento Cordial, estabelecido em 1904, fosse consolidado, e com grande expectativa de eficácia, face aos interesses vitais (como potência naval) da Grã-Bretanha, agora postos em jogo pelos apetites navais alemães.

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