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zassu

22
Jun15

Poesia e Fotografia 117

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

TELEGRAMA

 

Camaradas, cá vou sempre a cantar!

Os mesmos versos, mas com mais coragem.

Além de vós, além de mim, é o lar

Onde se aquece o frio da viagem.

 

Camaradas, prossigo,

Não sei se doido se ressuscitado.

Mas perdido ou liberto, vai comigo

O poema cantado!

 

Coimbra, 9 de Outubro de 1945

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21
Jun15

Poesia e Fotografia 116

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

COLHEITA

 

Os frutos vêm agora em pleno dia,

Maduros de certeza e de frescura.

A raiz, toda em húmus de alegria,

Pode mostrar ao céu cor e doçura.

 

O vento que passar apenas leva

Sementes doutro sonho por abrir.

Inverno que durar concentra e neva

Outros frutos futuros que hão-de vir.

 

Roxa de mosto, de saúde e rumo,

Na mais alta pernada,

A poesia é o sumo

Desta harmonia plantada!

 

Coimbra, 8 de Outubro de 1945

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20
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 54

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

8.- Zona do Pacífico, Ásia, Oceânia e África (Colónias)

 

8.1.- Zona do Pacífico, Ásia

 

Entre agosto e outubro de 1914, com a colaboração das forças australianas, japonesas e neozelandesas, as colónias ou possessões alemãs - Ilhas Carolinas, Marshall, Salomão, Marianas, Arquipélago Bismarck foram ocupadas.

Cing-Tao, um enclave na província chinesa de Shantung foi a que mais lhe custou perder à Alemanha.

Em poucas semanas, a influência alemã no Pacífico, com o sonho do império colonial, esfumou-se: exigia-se a presença da Armada naval, e esta estava «amarada» aos portos da metrópole europeia.

Novos senhores do Pacífico começam a tomar conta dele - Estados Unidos e Japão.

 

8.2.- África

 

Neste continente, as operações tiveram outra envergadura. O Togo Inglês caiu a 27 de agosto. Nos Camarões, embora os franceses e belgas tivessem ocupado a costa e penetrado no interior, não conseguiram aniquilar a resistência alemã.

No Sudoeste Africano e na África Oriental Alemã não se realizaram operações importantes.

Quanto às colónias portuguesas de Angola e Moçambique, em capítulo autónomo deste trabalho, abordá-las-emos.

 

8.3.- Oceânia

 

A Terra do Imperador na Nova Guiné (protetorado alemão) - foi também ocupada.

 

9.- Nos Mares

jutland.jpgQuer pelas suas posições estratégicas, quer pela dimensão da sua Armada, a Alemanha furtou-se a um confronto direto com os Aliados. Preferiu levar a cabo ações de desgaste, utilizando uma nova arma de guerra - os submarinos - quer contra os transportes mercantes, quer militares, quer civis contra os Aliados.

Os Aliados tinham assim organizado o controlo e direção da guerra naval: nos mares setentrionais (particularmente o mar do Norte), aos ingleses; o Mediterrâneo (à exceção do Mediterrâneo Oriental), aos franceses.

Em 1914, praticamente toda a marinha mercante do alto mar alemã, desapareceu dos mares. Militarmente, neste mesmo ano, as principais ações foram: a Batalha de Heligoland, a 28 de agosto; a Coronel, a 1 de novembro e Falkland, a 8 de dezembro.

Em 1915, no Mediterrâneo Oriental, como já amplamente referimos, quando tratámos da Frente do Médio Oriente, gorou-se a ofensiva inglesa e francesa aos Dardanelos.

Ainda em 1915, no mar do Norte, os alemães foram batidos em Dogger-Bank, em 24 de janeiro.

Pelo lado alemão, com o bloqueio naval dos Aliados, os alemães dão início, a 4 de fevereiro, à guerra submarina.

Face a um maior incremento da guerra submarina levada a cabo pelos alemães, os Aliados tiveram de empenhar-se em aperfeiçoar sistemas defensivos e vigiarem as rotas marítimas.

O maior encontro naval entre a esquadra alemã e britânica - Batalha da Jutlândia -, travou-se no golfo com o mesmo nome, em 1916. Muito a propósito, Norman Stone apelidou-a de uma «não batalha». Depois de se terem gastos rios de dinheiro, os alemães, para terem uma esquadra à altura da britânica; os britânicos para não ficarem atrás deles e mantendo a superioridade sobre os mares, ambas as frotas regressam aos seus respetivos portos para, durante o conflito, praticamente nunca de lá saírem.

No último dia de janeiro de 1918, a Alemanha envereda pela guerra submarina plena, tentando obter rapidamente uma decisão para o desfecho da guerra a seu favor, asfixiando a Grã-Bretanha pela não entrada de bens essenciais para a sua economia, pela destruição sistemática de todos os navios que se aproximassem da costa inglesa. Apesar das pesadas baixas, os britânicos, para além de construírem mais navios, encontraram um meio de fazer face a esta tremenda destruição: inventando sistemas de deteção de submarinos e utilizando o método dos comboios, acompanhados por meios navais de proteção.

Em resultado da guerra submarina plena e irrestrita, os norte-americanos, um dos países mais prejudicados nos seus interesses económicos com este tipo de guerra, e querendo salvaguardar o que tinham investido em empréstimos ao Aliados, declaram guerra à Alemanha.

A 13 de abril de 1917, no mar do Norte, a esquadra inglesa atacou as bases alemãs de submarinos de Ostende e Zeebougge.

No Adriático, entre 12 e 18 de outubro de 1917, a esquadra italiana fechou o Canal de Otranto e a Alemanha ocupou as ilhas do Golfo de Riga.

20
Jun15

Poesia e Fotografia 115

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

CONQUISTA

 

De que abismos irrompe a madrugada

E, feliz, amanhece!

Favorita velada

Do loiro sol que a aquece

Do seu alto passeio,

Vem de noite orvalhada

E rasga o manto onde escondia o seio.

 

E o seu corpo presente

Brota como as ervilhas nos canteiros.

Alvo de amor, contente,

Dá flores, dá fruto, sente,

E cantam-lhe aves nos pendões cimeiros.

 

Alegria é o seu verdadeiro nome.

Frescura a sua imagem natural.

Lutou pelo caminho traiçoeiro,

Quase um sapo a comeu num lodaçal.

Mas o dia rompeu,

E o mundo, agora, é luminoso e seu!

 

Coimbra, 6 de Outubro de 1945

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19
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 53

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

7.2.- Médio Oriente (Mesopotâmia, Cáucaso e Pérsia)

A entrada da Turquia na guerra abriu um novo e complexo teatro de operações no Médio Oriente. Pese embora a guerra-santa aberta pelo sultão Mehmet V, a presença britânica na região era justificada pela defesa dos seus múltiplos interesses. Desde logo, para controlar a navegabilidade do Canal do Suez, essencial à manutenção da rota marítima mais curta para a Índia e restantes domínios asiáticos; depois as novas viaturas de explosão e, de um modo especial, os novos couraçados - os Dreadnoughts - consumiam grandes quantidades de combustível, sendo estrategicamente decisivo o controlo dos campos petrolíferos do Golfo Pérsico.

Com a Turquia como inimiga, as posições britânicas na região estavam perigosamente ameaçadas, obrigando a Grã-Bretanha a concentrar na ilha do Bahrein a 6ª divisão Indiana, antevendo a necessidade de se empenhar na região da Mesopotâmia.

Nesta conjuntura, a Grã-Bretanha viu-se na obrigação de manter uma postura mais ofensiva em relação à Turquia. E é neste pressuposto que, a 7 de novembro de 1914, a força expedicionária britânica estacionada em Bahrein bombardeou as instalações portuárias turcas no Golfo Pérsico, desembarcando, seguidamente, na região de Shatt el-Arab, na confluência do rio Tigre com o Eufrates.

A 9 de dezembro as tropas britânicas apoderam-se de Basra, prosseguindo para noroeste.

Para proteção do Canal do Suez, em janeiro de 1915, o exército britânico no Egito era composto por 70 000 homens, muitos deles provenientes de parcelas do império como a Austrália, Índia e Nova Zelândia.

Os turcos, com a ajuda técnica alemã, preparavam-se para invadir o Egito, convictos que, com tal ação, desencadeariam uma revolta interna contra a presença britânica. O 4º exército turco, sob o comando de Ahmed Cemal, ia munido de pontões especiais, fabricados na Alemanha, para lhe facilitar a travessia do Canal do Suez. A 3 de fevereiro de 1915, a aproximação do 4º exército turco foi detetado junto a Ismailia por um avião francês de reconhecimento. As tropas britânicas de aviso prepararam-se para o ataque. Apesar dos combates ao longo do Canal do Suez se terem prolongado por uma semana, só um pelotão turco conseguiu efetuar o lançamento de um pontão. O insucesso do ataque e a indiferença da população egípcia ordenou a retirada das tropas turcas.

A situação no interior do Império Otomano agravou-se ainda mais com o início da revolta árabe contra o domínio de Constantinopla, liderada pelo Faisal ibn-Hussein, Xarife de Meca.

No Cáucaso - de longe a mais importante pelos efetivos em presença - a campanha de inverno de 1914-1915 revelou-se desastrosa para os turcos. A ação do exército russo e as severas condições meteorológicas originaram 77 000 baixas, de um total de 95 000 homens.

Na Mesopotâmia, entretanto, a força anglo-indiana aí desembarcada prosseguiu avanço até ao vale do rio Tigre, na direção de Bagdad. Em novembro, a sua guarda-avançada atingiu Ctesiphon, a 30 Km da atual capital do Iraque. O comandante da força, major-general Charles Townshend, apesar de não se encontrar ameaçado por nenhuma força inimiga com potencial de combate significativo, entendeu - erradamente - que o seu dispositivo estava muito alongado e decidiu recuar até Kut el-Amara e entrincheirar-se numa enorme e pronunciada curva do rio Tigre. O exército turco teve mais que tempo para o cercar - a sua divisão anglo-indiana -, isolando-a e impedindo-a de receber reforços do Golfo Pérsico. Perante esta situação, Townshend rende-se a 29 de abril de 1916. Só em fins de 1916 é que uma expedição, com cerca de 200 000 homens e que dominam a situação, tomando a iniciativa na Mesopotâmia.

Do Báltico ao Golfo Pérsico

Na primavera de 1916, graças à conquista da Sérvia pelas Potências Centrais, já com o alinhamento ativo da Bulgária, o esforço de guerra turco passou a dispor de uma ligação ferroviária entre a Alemanha e Constantinopla. A geografia da guerra, no que toca ao aspeto terrestre, dava uma clara vantagem e domínio para as Potências Centrais. Do Báltico ao Golfo Pérsico dominavam as nações lideradas pela Alemanha.

A resistência dos Aliados era, cada vez mais, face ao impasse e mortandade em série no Ocidente, o resultado da sua superioridade naval. Não admira, portanto, que a guerra submarina sem restrições fosse, para alguns responsáveis alemães, uma hipótese crescentemente ponderada e acarinhada. Como, de facto, em 1917, veio a acontecer.

Entretanto, na Mesopotâmia, o general Maude, em fevereiro de 1917, numa nova expedição anglo-indiana, reconquistou Kut el-Amara e prosseguiu para noroeste até se aproximar de Bagdad. A 11 de março, toma conta de Bagdad e continuou a ofensiva para norte a fim de se juntar às forças russas que combatiam no Cáucaso.

As tropas britânicas estacionadas no Egito, consolidadas que estavam as suas posições na península do Sinai, tentam, entre março e abril de 1917, atacar os turcos em Gaza e Beetheba. Mas o insucesso da ofensiva levou a que Londres substituísse o general Mauray pelo general Allenby.

O general Allenby,

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até então integrado na FEB, na Frente Ocidental, levava como missão a conquista de Jerusalém até ao Natal. Para o cumprimento deste objetivo tinha um efetivo reforçado de 88 000 homens, aos quais se juntaram meios navais e aéreos relevantes para que a operação tivesse sucesso. A 31 de outubro de 1917, os britânicos obtêm uma significativa vitória sobre Gaza e Beesheba, prosseguindo para norte apoiados por meios navais ao longo da costa. Allenby entra em Jerusalém a 9 de dezembro de 1917. Para o sucesso desta operação deve-se aqui enfatizar o contributo de duas grandes personalidades: o Faisal ibn-Hussein, Xarife de Meca e o domínio que teve sobre o eixo definido pela linha férrea Medina-Damasco, e o apoio dos serviços secretos britânicos, personalizados na figura lendária do capitão Thomas Edward Lawrence, o famoso Lawrence da Arábia,

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um profundo conhecedor da cultura árabe e convicto defensor da sua causa, vestindo trajes tradicionais árabes, e que soube mobilizar as tribos da península arábica contra o domínio turco, apoiando, política e militarmente, o general Allenby nas operações da conquista da Palestina.

Lawrence da Arábia, para além da sua lendária façanha e enorme conhecimento da cultura árabe, foi um escritor de invulgar talento. Sua figura e ação ficou imortalizada no cinema.

19
Jun15

Poesia e Fotografia 114

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

ETERNIDADE

 

A vida passa lá fora,

Ou na pressa de uma roda,

Ou na altura de uma asa,

Ou na paz de uma cantiga;

E vem guardar-se num verso

Que eu talvez amanhã diga.

 

Coimbra, 4 de Outubro de 1945

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18
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 52

 

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

7.- Frente do Sudeste Europeu e Médio Oriente

 

7.1.- Turquia e Sudeste Europeu

 

b).- Objetivo Dardanelos

A Royal Navy britânica, em janeiro de 1915, dava um claro apoio à ideia de uma expedição contra os estreitos turcos no Dardanelos. Winston Churchill era um dos mais firmes partidários da ação. Joffre, em França, na sua obsessão nacionalista da ofensiva a todo o custo, via na expedição uma forma de enfraquecer a vertente ocidental. Era, pois, contra, com firmeza. Reunião e mais reunião, até que lá se acabou por chegar a um consenso entre políticos e militares: a operação, que implicava abrir uma outra frente no sudeste europeu, ia ser levada a cabo.

A ação preparatória de bombardeamento da costa pela esquadra aliada teve um efeito muito aquém do esperado. Os Royal Marines (Fuzileiros Navais), a 4 de março de 1915, desembarcaram junto a Kum Kale e foram recebidos com intenso fogo de artilharia turca. Perante o desaire desta primeira operação anfíbia, os Aliados redobraram os cuidados e planearam nova ação para 18 de março, reunindo uma esquadra de 16 couraçados e cruzadores pesados - 12 britânicos e 4 franceses -, “precedidos por draga-minas e acompanhados de uma forte escolta de cruzadores ligeiros e destroyers, sob o comando do almirante Carden. Na longa história dos Dardanelos, jamais se vira uma esquadra com tanta riqueza de meios” (Afonso; Gomes, 2013: 184). Esta esquadra era integrada por uma força anfíbia Aliada - a Força Expedicionária do Mediterrâneo (FEM) -, composta por 5 divisões (duas britânicas, uma francesa e o Corpo Expedicionário Australiano-Neozelandês, a duas divisões), sob o comando do general Sir Ian Hamilton.

A operação de bombardeamento preparatório teve um início auspicioso, provocando grandes danos no dispositivo defensivo turco. Ao início da tarde, todavia, cerca de um terço dos couraçados foram postos fora de combate pela ação combinada da artilharia inimiga e do rebentamento de minas não neutralizadas pelo draga-minas. Estes, por seu turno, sofreram também graves perdas, revelando-se incapazes de cumprir a sua missão de desobstrução do estrito.

Ao fim do dia 18, o almirante Robek, que substituía Carden, ordenou a retirada da esquadra. A 22 de março, Robek e Hamilton chegaram à conclusão de que não se encontravam reunidas as condições para novo ataque aos Dardanelos. E concluíam que tal só seria possível com a participação inicial de uma forte componente terrestre que, neutralizando a artilharia móvel do exército turco, abrisse caminho aos navios - e não ao inverso, como havia sido inicialmente planeado.

c).- Galípoli

Neste novo plano, 25 de Abril de 1915 foi a data para o início da operação, que tinha por base a ilha de Lemnos, situada a pouco mais de 60 Km da entrada dos Dardanelos.

Segundo David Martelo, o planeamento da operação foi um surpreendente exemplo de improvisação, tanto mais indesculpável quanto era seguro que o ataque não apanharia de surpresa os defensores. Depois, os efetivos de 5 divisões era insuficiente para levar a cabo, e de vencida, a oposição turca. Por fim, no capítulo das informações, pouco se sabia acerca do inimigo - condição essencial para o êxito de qualquer ação ofensiva.

O comandante do FEM tentou adivinhar quais os lugares onde o desembarque teria menor oposição, escolhendo como objetivo principal a península de Galípoli. Com intenso fogo naval, a operação iniciou-se pelas 5 horas da manhã do já citado 25 de Abril de 1915. Certamente devido a erro humano, o Corpo do Exército (CE) australiano-neozelandês (ANZAC) - a quem cabia o ataque secundário - desembarcou cerca de uma milha a norte da praia prevista. A ausência imediata de oposição resultava da própria natureza do terreno, diz David Martelo, porque extremamente ravinoso e nada propício para uma rápida progressão para posições dominantes. Mas foi só o tempo de os turcos recomporem o seu dispositivo. Ao início da tarde, as tropas da ANZAC já estavam debaixo de intensos fogos dos defensores.

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Próximo do Cabo Helles, na extremidade sul da península, a 29ª divisão britânica desembarcou em cinco praias designadas pelas letras S V W X Y. Nas praias S X e Y a força britânica não encontrou oposição digna de registo e, rapidamente, consolidou posições. Já o mesmo não se passou nas praias V e W, localizadas exatamente na extremidade da península. Aí as unidades atacantes foram alvejadas por nutrido fogo de espingarda e metralhadora, logo que as embarcações se aproximavam 100 metros da terra. Mesmo assim, a maior parte das tropas concluiu o desembarque, embora contabilizando pesadas baixas. Ao chegarem às praias, no entanto, encontraram-nas vedadas por fiadas de arame farpado, atrás das quais a infantaria turca, protegida por trincheiras, fazia fogo como se estivesse numa carreira de tiro. Logo nos primeiros instantes as baixas nas unidades desembarcadas atingiram as centenas. Nesta crítica situação, a superior qualidade das tropas profissionais britânicas permitiu criar uma brecha na rede de arame farpado, irromper pelo dispositivo turco e acabar por consolidar uma cabeça-de-ponte.

Enquanto isso, a divisão francesa, que desembarcou na parte continental da Turquia, conquistou, sem grande dificuldade, o forte de Kum Kale, fazendo centenas de prisioneiros.

A pouco e pouco, os Aliados começaram a perceber-se que, apesar da eficaz resistência dos turcos, era reduzido o seu potencial de combate na extremidade da península. A maior parte dos núcleos de resistência era de efetivo companhia (150 homens) e alguns não ultrapassavam a de pelotão reforçado (50 homens). No total, só uma divisão - a 9ª - se encontrava na extremidade sul da península.

c.a).- Contra-ataque turco à ANZAC

Em estreita ligação com os alemães, era um general germânico, Liman von Sanders - que comandava superiormente o exército turco, mais a norte. Os turcos mantinham outras unidades em condições de intervir. A 19ª divisão, comandada por um jovem general, de 34 anos, Mustafá Kemal - elemento destacado do movimento Jovens Turcos, e futuro líder da República turca (1923) -, com grande habilidade, tomou conta das posições elevadas no terreno elevado, que constituía o objetivo ANZAC. Quando as tropas da ANZAC, comandadas pelo general Wiliam Birdwood, se aproximaram, foram violentamente atacadas, sofrendo baixas de vulto. As tropas ANZAC bateram-se com extraordinária tenacidade, sobretudo atendendo à posição de inferioridade que o terreno lhes conferia. A partir dos primeiros combates, estabeleceu-se um movimento constante de sobe-e-desce entre a cabeça do dispositivo e a praia: de cima para baixo, para evacuação de feridos; de baixo para cima, para envio de tropas frescas. A 4 de maio, o setor que opunha a divisão Kemal à ANZAC, as perdas atingiram 12 000, entre defensores e 10 000, entre os atacantes. Não conseguindo repelir para o mar o adversário, com tamanha capacidade de sofrimento, Kemal ordenou às suas tropas que cavassem trincheiras, formando uma linha defensiva que aumentava as vantagens que o terreno lhes concedia.

c.b).- Retirada de Galípoli

A partir de Cabo Helles e progredindo para norte da península, foram levadas a cabo sucessivas tentativas para penetrar e romper os dispositivos turcos na península de Galípoli. Sem sucesso.

Para tentar sair do impasse, o general Hamilton preparou uma nova ação anfíbia com unidades entretanto concentradas em Lemnos. A 7 de agosto, novo desembarque, na costa ocidental da península, na baía de Sulva. Kemal, reposicionando as tropas, imobiliza as forças aliadas. E Sulva transforma-se no 3º enclave aliado na península.

Diz Martin Gilbert: “Entre os soldados mortos na Baía Suvla, estava o primeiro cidadão da Terra Nova a ser morto em combate na Primeira Grande Guerra Mundial. O mais recente historiador da contribuição dos cidadãos da Terra Nova, escreveu: «O soldado David McWhirter não fez nenhum ataque corajoso. Não pronunciou nenhumas belas palavras finais. Muito simplesmente ali estava, ensurdecido pelo ruído das explosões de artilharia - um rapaz aterrorizado num uniforme que não lhe servia numa trincheira da Frente perto da colina de Karokol Dagh. De repente, vindo de lado nenhum, foi feito em pedaços vermelhos de caqui e carne por um projétil turco. De súbito, tinha partido, e os que estavam atrás dele na estreita trincheira ficaram atordoados. Cheios de estilhaços de metralha, sujidade e intestinos, ficaram a saber o que ia ser esta guerra»”(Gilbert, 2007: 288).

Em dezembro de 1915, perante a inutilidade do sacrifício aliado, decide-se dar por terminada a operação e consequente saída das tropas de Galípoli. A saída realizou-se sem que os turcos dessem conta da retirada. Daí que a evacuação se fizesse sem problemas de maior, mesmo as que estavam situadas nas cabeças-de-ponte. Resultado da operação: 265 000 baixas, do lado dos Aliados; 300 000 do lado turco. Para os Aliados, esta manobra de diversão foi um verdadeiro fiasco, com pesadas baixas. Winston Churchill tirou daí as respetivas conclusões, demitindo-se do comando do Almirantado.

c.c).- Galípoli e o 25 de Abril de 1915

Galípoli marcou particularmente a história da Austrália. O aniversário do desembarque da ANZAC continua a ser celebrado, anualmente, com a veneração própria das datas sagradas de uma nação. O local de desembarque - batizado pelos australianos como a Enseada da ANZAC - é o lugar de peregrinação dos descendentes dos combatentes que, todos os anos, atravessam meio mundo para visitar o local onde os seus antepassados se bateram e morreram.

Mustafá Kemal, já presidente da República, transformou a península num Parque Nacional, erigindo no local um monumento evocativo do martírio de todos o combatentes.

c.d).- Conclusões a tirar e especulações

Estrategicamente as consequências do insucesso foram enormes, em termos de luta e competição nesta frente, alastrando o conflito para o Médio Oriente, como de seguida vamos abordar.

Grande parte das especulações que se fizeram posteriormente assenta nas hipotéticas explicações que o êxito desta operação teria para os Aliados no desenrolar da guerra. Em primeiro lugar, a importância da ajuda em material de guerra a prestar à Rússia. Em segundo lugar, uma Rússia revigorada, vitoriosa sobre os Impérios Centrais, consequentemente inviabilizaria a eclosão da revolução bolchevique de 1917. Assim, claro, a história do século XX seria reescrita de outra forma, sendo substancialmente diferente.

Só que uma coisa é «se fosse»; outra é «o que foi»!

Neste episódio, que representa a capacidade e a enorme força dos homens e mulheres de três povos para se afirmarem como nações - Turcos, Australianos e Neozelandeses - digno de uma história de bravos e heróis que lutaram determinados por uma causa que os elevou ao Olimpo, tornando-os objeto de veneração nacional de todos os seus concidadãos, há também, e infelizmente, a registar o massacre do pacífico e infeliz povo arménio, nas mãos dos Jovens Turcos. Uma história triste e trágica que não cabe aqui contar. Mas que urje, e é fundamental frisar que, tal como uma moeda tem duas faces, a História, digna desse nome, deve exibir, para uma correta e adequada leitura, todas as faces que contém. Sem esta postura - de total abertura e isenção - não há História. Simplesmente uma farsa! Que impede a progressão da Humanidade.

18
Jun15

Poesia e Fotografia 113

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

PROMISSÃO

 

O futuro é o meu reino, e eu caminho!

Lágrimas? Tantas, só de ser artista,

Que, se as relembro, turva-se-me a vista

E não vejo a miragem que adivinho.

 

Mas nem choro as lágrimas do passado,

Nem pranteio as presentes;

Vou com olhos contentes,

Feliz de não chorar por ter chorado.

 

Coimbra, 2 de Outubro de 1945

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13
Jun15

Grande Guerra (1914-1918) - 51

 

 

 

A GRANDE GUERRA (1914-1918)

E A PARTICIPAÇÃO DOS MILITARES DO RI 19 E DO ALTO TÂMEGA NO CONFLITO

 

PRIMEIRA PARTE

CONTEXTO INTERNACIONAL

(DA PLACIDEZ TECTÓNICA AO MOVIMENTO DAS PLACAS) 

 

V

AS FRENTES DE COMBATE

(OU AS GRANDES ONDAS DE CHOQUE)

 

7.- Frente do Sudeste Europeu e Médio Oriente

 

7.1.- Turquia e Sudeste Europeu

a).- Turquia

 

Em novembro de 1914, a guerra começava a assumir feição verdadeiramente à escala mundial.

Stone (2010) afirma que Napoleão teve o seu calcanhar de Aquiles, que foi a Península Ibérica; os Aliados iriam também ter o seu, que se chamava Turquia.

Procuremos entender melhor o «estorvo» que a Turquia representou para os Aliados, face à importância vital da sua posição charneira no Império Otomano, mas principalmente como porta de entrada para os territórios do Médio Oriente (Mesopotâmia-Iraque) e a Pérsia (Golfo Pérsico), estratégicos, pelas suas jazidas de petróleo, e, como tal, fundamentais para alimentar uma economia agora mais baseada no consumo deste produto e já não tanto no carvão.

Importava, pois, que a Turquia fosse «engolida». As grandes potências consideravam-na fraca e, portanto, presa fácil. Para os Aliados, as minorias cristãs poderiam ser úteis, em termos de seus agentes. Embora alguns especialistas soubessem que os turcos não estavam bem armados, nem todos, contudo, pensavam da mesma maneira.

Na pressuposição desta mal preparação da Turquia, surge o primeiro erro dos britânicos na zona, protagonizado por Winston Churchill. Em 1914, Churchill, comandante do Almirantado, requisitou dois couraçados, que estavam a ser construídos em Newcastle, por subscrição pública, para a Marinha turca.

Prontamente, os alemães, com os seus dois couraçados - Goeben e Breslau -, entram em águas turcas do mar Negro e põem-se ao serviço da Turquia. Foi o suficiente para a opinião pública turca se virar pró-alemã.

Não se pense que na Turquia tudo se passava como se houvesse uma unidade nacional firmemente consolidada. Muito pelo contrário. No seio da sociedade turca começou a despontar um movimento, liderado pelos denominados Jovens Turcos, pró-germânicos que, juntamente com Enver Paxá, ministro da Guerra, e aparentado com o sultão, seguia o modelo de nacionalismo revolucionário francês, militantes fervorosos do evoluir dos vitoriosos estados balcânicos. Estes militantes revolucionários estavam apostados na construção de um novo país, com uma nova língua, uma nova interpretação da história e um futuro exclusivamente nacional.

A entrada dos dois couraçados alemães no mar Negro foi um daqueles momentos providenciais para levarem por diante os seus desígnios: assumindo formalmente o controlo daqueles navios alemães, fingindo-se de turcos, içando o pavilhão otomano, bombardearam os portos russos de Odessa, Sebastopol, Novorossik e Feodosia na expectativa de os russos declararem guerra à Turquia. E foi o que aconteceu. Enver Paxá,

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e os Jovens Turcos, saíram-se bem. Seguiu-se depois a demissão de vários ministros otomanos do governo, em protesto contra esta provocação.

A 5 de outubro, a Turquia declara guerra à França e à Grã-Bretanha.

Enver Paxá começa por invadir a Rússia pelo Cáucaso, mas sofreu um revés colossal: no planalto de Sarikamis, 100 000 dos seus homens morreram de doenças e de frio. Um comandante alemão, Kress von Kressenstein, sofreu outro desaire no Suez. Mas, para Enver Paxá, o episódio era um simples acidente de percurso. Segundo ele, do sofrimento nasceria uma nação turca que olharia para a Turquia propriamente dita e não para o mundo árabe.

Se bem que o projeto tivesse pernas para andar, não foi Enver Paxá que o concretizou, mas um outro homem, de muito maior estatura - Kemal Atatürk.

Com a situação no Império Otomano neste pé, para os britânicos fazia todo o sentido um avanço para Levante a fim de «arrumar» com os turcos. E os argumentos que se punham na balança tinham algum peso.

Primeiro, perante a gritante falta de armamento, munições e equipamento nos exércitos russos, era necessário um transporte rápido e curto do ocidente para o oriente. Para o levar a cabo a via mais indicada era a marítima. Como o Báltico era dominado pela Marinha alemã, havia três vias ou rotas possíveis: a que conduzia aos portos do mar Barents; a rota de Vladivostoque e a do mar Negro. Afastadas as duas pelos inconvenientes ponderados, restava a mais fácil - a terceira - que, a ser bem-sucedida, possuía duas vantagens: aliviar os russos da gritante falta do material bélico de que precisavam e por fora de combate os Jovens Turcos e a sua nova Turquia. Face ao impasse e imobilismo da guerra a Ocidente, políticos e militares viam nesta manobra uma ação de diversão que poderia vir a tornar-se não só interessante para o futuro da guerra como, porventura, decisiva.

O segundo argumento era que esta iniciativa poderia levar a que alguns países neutros ponderassem ou admitissem juntarem-se aos Aliados. Foi o que aconteceu com a Itália, a Grécia e a Bulgária. Embora a segunda voltasse depois à neutralidade, com os Aliados a deixar uma força em Salónica subaproveitada e a ser atacada pela malária, e a terceira a interromper as negociações e a lançar-se nas mãos das Potências Centrais, era uma estratégia correta, pois, quantos mais países aliados houvesse com posições estratégicas, melhor seria para o destino do conflito.

13
Jun15

Poesia e Fotografia 112

 

 

POESIA E FOTOGRAFIA

  

POEMAS NOS DIÁRIOS DE MIGUEL TORGA

 

SEMENTEIRA

 

Foi a mão como um ralo a semear

Que me disse que sim, que acreditasse;

Que a vida era um poema a germinar,

E portanto cantasse!

 

Coimbra, 1 de Outubro de 1945

2015 - Alanhosa+Senhora da Saúde (125).jpg

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